Temperatura de armazenamento de tangores 'Murcote' minimamente processados
COMUNICAÇÃO CIENTÍFICA
COLHEITA E PÓS-COLHEITA
Temperatura de armazenamento de tangores 'Murcote' minimamente processados 1
Storage temperature in minimally processed tangor 'Murcote'
Ricardo Alfredo KlugeI; Maria Carolina Dario VittiII; Eliane BassettoIII;
Angelo Pedro JacominoIV
IProfessor Dr. do Depto de Ciências Biológicas, ESALQ/USP. C. Postal 9, 13418-
900, Piracicaba-SP. Bolsista do CNPq. rakluge@esalq.usp.br
IIMestranda em Fisiologia e Bioquímica de Plantas, ESALQ/USP. Bolsista da CAPES
IIIMestranda em Fitotecnia, ESALQ/USP. Bolsista da CAPES
IVProfessor Dr. do Depto de Produção Vegetal, ESALQ/USP. Bolsista do CNPq
O Brasil é o maior produtor mundial de frutas cítricas, sendo a laranja, a
tangerina e a lima ácida as mais produzidas (FNP, 2003). Cerca de 3 milhões de
toneladas de citros são destinadas a este mercado, anualmente, no Brasil (FNP,
2003). A maior parte destas frutas é comercializada a granel ou em sacos de 1 a
5 kg e consumida na forma de suco nas residências, restaurantes e lanchonetes.
Para ser consumida na forma de fruta é necessário que seja descascada e algumas
vezes fatiada. Por outro lado, é muito oneroso para os restaurantes preparará-
las antes de oferecer a seus clientes.
Uma alternativa para aumentar o consumo como fruta e não como suco, é o
processamento mínimo, o qual possibilita a obtenção de produtos frescos e
convenientes. Esta tecnologia já é realidade para as hortaliças, mas em relação
às frutas ainda falta conhecimento a respeito do comportamento fisiológico
desses produtos, quando preparados (Cantwell, 1992).
Este tipo de produto apresenta vida de prateleira mais curta que os produtos na
sua forma intacta, considerando que sofrem uma série de estresses durante o seu
preparo, principalmente os oriundos do descascamento e corte. Isto favorece o
aumento no metabolismo geral do produto e maior predisposição à infecção por
microrganismos patogênicos (Brecht, 1995; Verlinden & Nicolai, 2000).
Assim, o uso de baixa temperatura durante o preparo, conservação e
comercialização dos produtos minimamente processados é fundamental para que os
mesmos alcancem a sua máxima vida de prateleira, sem perda de qualidade e
riscos para a saúde do consumidor.
O tangor 'Murcote' apresenta potencial para ser comercializado na forma de
produto minimamente processado, considerando a dificuldade que existe quanto ao
descascamento manual do fruto. Poucos estudos, entretanto, existem sobre o
processamento mínimo deste fruto, sendo que o objetivo deste trabalho foi
determinar a temperatura de armazenamento que proporciona manutenção da
qualidade de tangores 'Murcote' minimamente processados.
Foram obtidos Tangores 'Murcote' provenientes de pomar comercial localizado em
Holambra. Os frutos foram selecionados quanto à ausência de danos mecânicos e
infecção fúngica e pré-lavados em água corrente com o objetivo de retirar as
impurezas vindas do campo. Após, foram transferidos para câmara fria a 10°C
para serem minimamente processados. Os frutos foram processados em mesa de
inox, devidamente higienizada. Os operadores utilizaram botas, aventais, luvas,
máscaras e toucas, como parte das condições mínimas de assepsia.
Os frutos foram sanitizados via imersão durante 6 minutos em água clorada
(200ppm de cloro ativo) com o objetivo de reduzir riscos de contaminação. Após,
os frutos foram descascados manualmente e submetidos à separação manual dos
segmentos. Esses foram então acondicionados em embalagem rígida de
politereftalato de etileno da marca Fruit Pack modelo TB 03/60 com taxa de
permeabilidade ao oxigênio de 12.081cm3.m-2.dia-1 e área de permeação de
360cm2.
O armazenamento foi realizado a 2, 6 e 12oC durante 9 dias, sendo que as
avaliações foram realizadas a cada 3 dias. O delineamento experimental
utilizado foi inteiramente ao acaso em esquema fatorial 3x4 (3 temperaturas de
armazenamento e 4 períodos de avaliação, incluindo o tempo zero). Utilizaram-se
4 repetições de 8 segmentos em cada.
As variáveis analisadas foram: teor de sólidos solúveis totais (SST), por
leitura direta em refratômetro digital Atago modelo Palete 101, utilizando-se
suco de todos os segmentos, com os resultados sendo expressos em ºBrix; acidez
total titulável (ATT), determinada por titulometria e resultados expressos em
mg de ácido cítrico por 100mL de suco; relação SST/ATT, pelo quociente dos dois
constituintes; coloração: determinada com colorímetro Minolta CR-300, fazendo-
se duas leituras por segmento, uma de cada lado na região central do mesmo, com
os resultados sendo expressos em cromaticidade; análise sensorial (qualidade
global), realizada por uma equipe de 5 provadores treinados, utilizando-se uma
escala de notas, onde 5 = excelente (segmentos com aspecto de frescor e
ausência de líquidos extravazados), 4 = bom (segmentos levemente ressecados e
com início de líquidos extravazados), 3 = regular (segmentos com pouco aspecto
de frescor e moderado grau de extravazamento de líquidos), 2 = ruim (segmentos
sem aspecto de frescor, com elevado grau de extravazamento de líquido) e 1 =
péssimo (segmentos totalmente desidratados, não comestíveis). A nota 4 foi
considerada como limite de comercialização e portanto ao atingir esta nota o
produto era descartado.
Os resultados foram submetidos à análise de variância (teste F) e a diferença
mínima significativa foi determinada. Diferenças entre dois tratamentos maior
que a soma de dois desvios padrões foram consideradas significativas (P <
0.05).
Os teores de SST não apresentaram alterações significativas em função dos
tratamentos, tendo oscilado entre 10,2 e 10,9oBrix (Tabela_1). Estes dados são
concordantes com aqueles obtidos por Pretel et al. (1998), que verificaram, em
laranjas minimamente processadas, comportamento similar para os teores de SST
durante o armazenamento.
Os valores de ATT também se mantiveram praticamente inalterados durante o
armazenamento, com valores entre de 0,87 e 0,94% (Tabela_1). Pretel et al.
(1998) também observaram, em laranjas minimamente processadas, uma
estabilização nos valores de ATT durante a conservação refrigerada. O que
também foi observado para a relação SST/ATT (Tabela_1).
Houve um acréscimo à cromaticidade dos segmentos nas três temperaturas de
armazenamento utilizadas durante o período de armazenamento (Figura_1). O que
indica aumento na intensidade da coloração. Desta forma, verificou-se que houve
uma intensificação da coloração alaranjada nos segmentos, a qual ocorreu de
forma gradual com o tempo de armazenamento e com aumento da temperatura de
armazenamento. Isto se deve, provavelmente, à degradação da pectina que recobre
os segmentos tornando-os mais transparentes.
Após 9 dias de armazenamento, os segmentos mantidos a 2ºC apresentaram notas
significativamente maiores de aparência, que os mantidos nas outras
temperaturas (Figura_2). Os segmentos armazenados a 6ºC e a 12oC puderam ser
conservados apenas por 3 dias, sendo que após este período, apresentaram-se
ressecados e com extravazamento de suco. Considerando os resultados obtidos
pode-se inferir que tangores 'Murcote' minimamente processados podem ser
mantidos durante 9 dias em temperatura de 2oC, com pouca perda de qualidade.
A temperaturas bem superiores às normalmente recomendadas (5ºC), alcançando
muitas vezes 12-15ºC, reduziu muito a vida útil do produto. Assim ficou
evidenciado no presente trabalho que o controle da temperatura é fundamental
para a preservação da qualidade do produto minimamente processado. Futuros
trabalhos com períodos maiores de conservação e análise microbiológica
determinarão a máxima capacidade de conservação de tangores 'Murcote'
minimamente processados.