O papel do enfermeiro como educador junto a cuidadores familiares de pessoas
com AVC
PESQUISA
O papel do enfermeiro como educador junto a cuidadores familiares de pessoas
com AVC
The nurse's role as an educator toward people who care for BVA patients
El papel del enfermero como educador de cuidadores familiares de personas con
AVC
Silvia Cristina Mangini BocchiI
IEnfermeira. Professora Assistente junto ao Departamento de Enfermagem da
Faculdade de Medicina de Botucatu - UNESP. Doutora em Enfermagem. E-mail do
autor: sbocchi@fmb.unesp.br
1 Introdução
Este artigo é parte de um trabalho extenso, em que a autora vem desenvolvendo
processos investigatórios sobre cuidadores familiares de pessoas com AVC,
visando ampliar o conhecimento sobre o objeto, como uma estratégia
retroalimentadora do ensino, da pesquisa e da assistência.
Num primeiro momento realizou-se um estudo bibliográfico em periódicos, quando
a mesma analisou a produção do conhecimento sobre a temática.
O trabalho apontou ser um conhecimento, essencialmente internacional, tendo seu
marco na década de 80, sendo recente, tanto para a Enfermagem, quanto para as
outras profissões interessadas no trabalho com familiares cuidadores de pessoas
com AVC(1).
As tendências demonstram um aumento na produtividade de trabalhos científicos,
visando um aprofundamento na temática para as próximas décadas, tanto em pólos
tradicionais, representados pelos Estados Unidos e Reino Unido e países
vizinhos, quanto uma expansibilidade para outros continentes(1).
No Brasil, o conhecimento se encontra em processo de emergência, em grandes
centros de pós-graduação, a partir da segunda metade da década de 90(1).
Como o relatório final do trabalho se apresentou extenso e por se tratar de um
assunto pouco explorado no Brasil, em tempos aonde o AVC vem se constituindo
como a causa principal de internações, mortalidade e incapacidades em nosso
país e justamente, quando o Programa de Saúde da Família (PSF) é
operacionalizado, o que tem remetido a Enfermagem à busca por referenciais
norteadores de sua assistência às famílias é que a autora decidiu comunicar o
conhecimento, por meio de vários artigos.
O objetivo deste é apresentar o conhecimento relacionado ao papel educativo do
enfermeiro junto a cuidadores familiares de pessoas com AVC, que se constituiu
como uma das temáticas relevantes a partir dos artigos analisados.
Ressalta-se que o AVC é uma doença que gera déficits funcional e cognitivo,
mudança de personalidade ou comportamental e de comunicação(2,3). Estas
seqüelas decorrentes da doença geram níveis de incapacidades, comprometendo não
somente o paciente, mas a família e a comunidade(4).
2 Método
Trata-se de parte de uma pesquisa bibliográfica mais extensa, que envolveu um
corpus de análise contendo 70 artigos, localizados por meio das bases de dados:
Medline, Lilacs, Cinahl, desde o início das mesmas, mediante a seguinte
combinação: stroke and carer or caregiver or family or spouse or partner e
restritos às línguas portuguesa, espanhola e inglesa.
Para sistematizar o conhecimento, utilizou-se da análise temática, uma das
técnicas de análise de conteúdo(5).
Desta forma, este artigo é um recorte dessa pesquisa e, portanto, reúne a
análise de 36 artigos, dos quais emergiram duas categorias, denominadas como:
intervenção educacional na fase aguda e suporte pós-alta hospitalar. Elas
congregam, especificamente, a produção do conhecimento publicada em periódicos
nas décadas de 80 e 90 relativa ao papel do enfermeiro como educador junto a
cuidadores familiares de pessoas com AVC.
3 Apresentando a produção do conhecimento
3.1 Intervenção educacional na fase aguda
O processo educativo tem se constituído como uma das principais intervenções,
junto a pacientes e familiares de pessoas com AVC.
Nesse processo a família é tão importante quanto o paciente em determinar
resultados positivos durante a reabilitação, constituindo-se num dos focos de
avaliação e de intervenção(6).
Fundamentado nestes princípios, o processo educativo tem se iniciado durante a
internação, para aumentar as estratégias de coping, relacionadas aos problemas
a serem enfrentados durante o cuidado domiciliar, visando reduzir os níveis de
ansiedade antes da alta(7) e preparando o paciente e seus familiares para a
transição hospital-domicílio, bem como na reintegração do paciente à sociedade
(8,9).
Por outro lado, há autores que defendem a educação junto a pessoas com AVC e
seus familiares como uma intervenção efetiva melhorando as situações de cuidado
domiciliar não só para o paciente, mas também para os cuidadores. Eles
ressaltam, no entanto, que a educação por si só não é uma condição suficiente
para facilitar a adaptação após um AVC(10).
Como exemplo de suporte a família de pessoas com AVC, nós encontramos cinco
artigos que abordam, positivamente, sobre experiências com o processo
educativo, sendo três implementados somente em ambientes hospitalares(8,11,12).
Os demais descrevem a viabilidade de programas de alta precoce, iniciados em
cenários hospitalares e com continuidade em domicílios de pessoas com a doença
(13,14).
Dos três programas educativos implementados somente em hospitais, o que mais se
aprofunda no conteúdo oferecido é o desenvolvido pela Neuroscience Unit do
Mount Sinai Medical Center, Cleveland, Ohio, EUA, que tem sido adotado como
modelo de assessorias em outras instituições que estão planejando o mesmo tipo
de intervenção com seus pacientes(12).
O programa é oferecido durante quatro sessões de 90 minutos, por uma equipe
multiprofissional, formada por enfermeiros, fisioterapeutas, terapeutas
ocupacionais e assistentes social, sob a coordenação de um enfermeiro. Esta
equipe é preparada teoricamente sobre os seguintes assuntos: - gerenciamento de
um grupo de suporte com tempo limitado; - a aprendizagem do adulto; e -
dinâmica familiar(12).
Os objetivos deste programa são: - promover educação a pacientes e seus
familiares sobre a doença, déficits neurológicos e acerca do processo de
reabilitação; - proporcionar a pacientes e seus familiares avaliação da equipe
interdisciplinar; - oferecer suporte emocional aos membros da família num
ambiente grupal; proporcionar oportunidade de compartilhar sentimentos,
experiências e estratégias de copingcom outras pessoas vivenciando experiências
similares; reduzir a ansiedade dos membros ao esclarecer dúvidas; - servir como
cenário de ensino para o enfermeiro(12).
O conteúdo programático tem abordado as seguintes temáticas: - o que é o AVC?;
- como um AVC muda a comunicação; - as necessidades de cuidado físico; - como
pode um AVC mudar o comportamento do paciente e afetar a família(12).
Já o oferecido pelo St. Margaret Mercy Healthcare Center, Hammond, Inglaterra
acrescenta outros tópicos como: conhecimentos sobre hipertensão; informações
sobre nutrição; cuidados com as eliminações; sexualidade e auto-imagem,
administração de medicações e segurança no ambiente(8).
Os dois conteúdos propostos contemplam o assunto relacionado aos distúrbios da
comunicação. Portanto, se faz necessário que os profissionais ofereçam
orientações, logo na fase aguda do AVC, tanto para os familiares de pessoas com
afasia severa como para as leves, visto que os cônjuges de afásicos leves
demonstraram possuir menos conhecimento sobre o assunto, quando comparados com
os de maior severidade, por se tratar de uma das seqüelas que quando associada
a outras tem evidenciado níveis maiores de depressão(3).
A avaliação do programa demonstrou que o mesmo estimulou a família a verbalizar
o desejo de reduzir os fatores de riscos em si, havendo um entendimento sobre:
como o AVC afeta o corpo, as mudanças de personalidade e comportamento
provocadas pela doença, bem como o processo de reabilitação(12). Observou-se
também, uma participação maior destes sujeitos no cuidado do paciente e no
suporte entre eles. Muitos familiares percebiam a importância de se reservar um
tempo para os mesmos, assim como de expressar sentimentos e perceber que os dos
outros eram similares. Este programa, também, teve um impacto positivo, sobre a
conscientização dos enfermeiros incluírem as famílias nos processos de ensino e
de suporte.
Os resultados da avaliação feita de determinada pesquisa, mostraram que os
familiares manifestaram entusiasmo e interesse em adquirirem conhecimentos e
por entenderem princípios básicos sobre a reabilitação acabaram baixando seus
níveis de ansiedade(11).
Vários fatores, no entanto, vêm afetando a capacidade da enfermeira oferecer
intervenções de suporte e de educação para as famílias de pessoas na fase aguda
do AVC. Dentre eles, a redução da permanência hospitalar do paciente,
acompanhada pelo aumento do número de internações de pacientes com a doença e
pela redução do quadro de pessoal(12).
Desta forma, a alta hospitalar precoce vem ganhando apoio sustentado na
premissa que a reabilitação especializada no domicílio é viável, sem um aumento
nas porcentagens de readmissões ou estresse dos cuidadores. Esta modalidade se
mostra tão efetiva quanto ao cuidado convencional oferecido por hospitais. A
redução significativa de ocupação de leitos pode ser alcançada por meio da
provisão de equipe de reabilitação comunitária(15).
Esta é uma modalidade assistencial que atende aos pressupostos de que somente o
processo educativo e de suporte hospitalar não garantem que os problemas de
coping em relação à doença desaparecerão(16), pois a descontinuidade tende a
levá-los, novamente, a graus de ansiedade e depressão(7). Desta forma as
famílias de pessoas com AVC necessitam da continuidade do cuidado, bem como de
uma referência a quem se voltarem para auxiliá-los quando os problemas surgirem
no domicílio(16).
Encontrou-se dois modelos de assistência, visando a alta precoce. O primeiro
inicia dentro de 24 a 48 horas da admissão hospitalar, com continuidade após a
alta, por meio de programas de home care. A principal estratégia utilizada pela
enfermeira no domicílio é o sistema de parceria com metas estabelecidas entre a
enfermeira, o cuidador e o paciente, visando ajudá-los a gerenciar os problemas
relacionados ao AVC. A avaliação deste tipo de programa tem demonstrado uma
melhora no coping e na adaptação, tanto do paciente quanto do cuidador familiar
(13).
A outra modalidade é denominada serviço de alta hospitalar com suporte
estendido a pessoa com AVC por meio da reabilitação individualizada na
comunidade. Ela é tida como viável, mesmo tendo um período de internação curto,
sendo possível se fazer um diagnóstico acurado e avaliações médicas das
necessidades sociais e de reabilitação. Os autores defendem que um período
longo de internação pode resultar em comportamento de dependência do paciente,
tornando sua reintegração à família e à comunidade difíceis. A avaliação desta
modalidade demonstra uma alta tranqüila, organizada, com suporte intensivo e
com reabilitação necessária, resultando em uma economia significativa em dias
de ocupação de leitos(17).
Os estudos vêm explorando vários aspectos relacionados ao processo ensino-
aprendizagem iniciado no hospital, dentre os quais a de se fazer um diagnóstico
individualizado das necessidades educacionais dos familiares, antes de iniciá-
lo.
Existem pesquisas demonstrando que as esposas de pessoas com AVC têm a
percepção de que 66% de suas necessidades durante a fase aguda da doença não
são atendidas, eficientemente, pela equipe de enfermagem(35). Dados estes que
vêm corroborar os sentimentos observados por pesquisadores(19) ao depararem com
reclamações de seus familiares sobre as orientações falhas que haviam recebido
durante a internação, relacionadas a saúde dos mesmos.
Recomenda-se, conquanto, que o processo educativo seja fundamentado por uma
teoria educacional destinada a adultos, onde os enfermeiros devem avaliar,
individualmente, as necessidades educacionais dos cuidadores familiares, da
mesma forma que faz com as necessidades físicas e emocionais, sempre levando em
consideração as incapacidades dos pacientes(20).
Assim, recomenda-se, ainda, ainda que as necessidades educacionais, tanto do
paciente quanto da família precisam ser reavaliadas, continuamente, assim como
o ensino deve acompanha-las, mesmo após o paciente ter recebido alta da
reabilitação.
Diante dos achados e por acreditar que os enfermeiros estão numa posição
favorável para trabalhar com familiares cuidadores como educadores, os autores
sugerem ainda que seja incluso nos currículos de Enfermagem abordagens
referentes ao ensino de adultos, visando instrumentaliza-la durante suas
intervenções educacionais(20).
Outra questão explorada pelos estudos, durante o processo ensino-aprendizagem
oferecido aos familiares de pessoas com AVC é a relação entre a quantidade de
informação oferecida a eles durante a hospitalização e suas habilidades de
coping com as situações após a alta.
Um primeiro trabalho explorando a relação entre essas variáveis(21) demonstrou
não ter encontrado correlação significativa entre elas, no entanto o autor
reconhece que seus resultados não são conclusivos, visto que o mesmo não
considerou algumas variáveis intervenientes como: nível de escolaridade, idade,
raça, dentre outras.
Por outro lado, é importante que haja desmistificação entre os profissionais da
saúde, que consideram a ansiedade e a depressão entre os cuidadores como
fatores limitantes na quantidade de informações retidas por eles(22). Este tipo
de estereotipo entre os profissionais da saúde é encontrado, principalmente,
junto aos enfermeiros, contribuindo, negativamente, sobre os programas de
reabilitação e bem-estar do cuidador, sendo uma das justificativas pelo qual os
cuidadores, algumas vezes, sentem-se negligenciados em instituições de saúde.
Quanto às abordagens educacionais, buscou-se observar qual seria a mais
eficiente. Assim os autores compararam a oferecida pela instituição,
considerada rotineira a outras duas: uma de abordagem tradicional e a outra
fundamentada na resolução de problemas. Os autores observaram que os dois tipos
de intervenções educacionais, tanto na abordagem tradicional quanto na
fundamentada na resolução de problemas promoveram aprendizagem sobre os
cuidados com o doente, bem como na melhoria da função familiar quando
comparadas com a rotineira. No entanto, a abordagem educacional baseada no
método de resolução de problemas foi mais efetiva que a tradicional, resultando
numa melhor adaptação do paciente em um ano após o início da doença. Durante o
acompanhamento de todas famílias se observou que aquelas que não tinham sofrido
nenhum tipo de intervenção educacional eram disfuncionais. As áreas da função
familiar que foram, positivamente, influenciadas pelas intervenções estavam
associadas com os déficits de solução de problemas e de comunicação. A
resolução de problemas de forma saudável foi observada em ambas intervenções
durante um ano de acompanhamento. Percebeu-se que a família quando é capacitada
a solucionar problemas de maneira efetiva, preserva sua integridade, lidando
com as situações estressantes durante o processo de reabilitação e no
enfrentamento das mudanças no estilo de vida, freqüentemente, impostos pelo
AVC. Além disso, as intervenções ajudaram as famílias a se comunicarem de forma
clara e direta(23).
3.2 O suporte após a alta hospitalar
Embora as perspectivas para o portador de AVC sejam mais promissoras que
anteriormente, a necessidade por reabilitação continua envolvendo pacientes e
familiares. Uma atmosfera encorajadora e de suporte para o cuidador e o seu
entendimento sobre as mudanças físicas e emocionais da pessoa com AVC, são
determinantes essenciais para uma reabilitação bem sucedida, após a alta
hospitalar. O envolvimento da família no cuidado e a provisão de educação sobre
a recuperação após AVC contribuem para uma melhor qualidade de vida, tanto para
o paciente quanto para os familiares(24).
Os trabalhos têm demonstrado que somente os serviços de suporte hospitalar e
domiciliar oferecidos a pessoas na fase aguda do AVC, não são suficientes para
reduzir o estresse dos cuidadores em longo prazo. Isto denota que as
intervenções não devem se restringir apenas ao período agudo, mas serem
reforçadas durante o período de recuperação(25).
Os cuidadores, na maioria das vezes, sentem-se insatisfeitos, incapazes e
inseguros, assumindo seu papel, porque não têm a segurança se estão atendendo,
adequadamente, as necessidades básicas do seu ente, no domicílio. Diante deste
fato e sabendo que serão eles que assumirão os cuidados é necessário que a
enfermagem promova o envolvimento da família no preparo para alta hospitalar. O
oferecimento de informações e oportunidades para a aquisição de conhecimentos e
de habilidades, que lhes podem conferir segurança e competência mínima em
atividades como: ministrarem medicações e cuidados com a higiene, a
alimentação, as incontinências, dentre outros cuidados considerados essenciais
e que podem ajudá-los neste processo(26).
A família e principalmente os cônjuges têm demonstrado interesse e avidez em
obter conhecimentos sobre a doença, principalmente quando cuidando daquelas
pessoas com AVC com níveis maiores de dependência(27).
Esse interesse se evidencia, quando se busca avaliar as questões mais
freqüentes que os cuidadores possuem no decorrer do tempo.
As dúvidas mais freqüentes entre familiares, cônjuges e pacientes, após um ano
do AVC, são aquelas que dizem respeito à doença, ao suporte comunitário, as
associações de pacientes, as dificuldades com a fala, a reabilitação, bem como
as mudanças de personalidade e a depressão(28).
Os questionamentos são contínuos e apenas mudam seu teor durante o tempo. Isto
foi observado durante o acompanhamento de cuidadores durante dois anos após o
AVC, quando percebiam que os tipos de questões mudavam durante o tempo(14). Em
duas semanas após o AVC, seis e 24 meses, uma média de três questões era feita
para cada paciente. As perguntas sobre aspectos básicos do AVC eram comuns, mas
diminuíam com o tempo. O medo de recorrência se fez presente em todos os três
períodos das entrevistas. As questões sobre os acometimentos psicológicos
provocados pelo AVC tornaram-se prevalentes entre seis a 24 meses. Ainda nos
dois anos de acompanhamento, 32% deles perguntavam sobre dificuldades de
concentração/memória, no entanto, pouco se perguntava sobre o cansaço, a
depressão e a frustração referentes ao próprio cuidador. Após dois anos, 18% da
amostra estava incerta sobre as mudanças na recuperação futura de seu ente.
Percebe-se, no entanto, que este tipo de suporte é importante no desempenho do
papel dos cuidadores familiares como demonstram os trabalhos que avaliam,
comparando aqueles que participavam deste tipo de assistência com os não
participantes. Os resultados demonstram cuidadores com níveis menores de
depressão e maiores habilidades no desempenho de seus papéis(29,30).
Avaliando o nível de satisfação do cuidador com relação aos serviços fornecidos
às pessoas com AVC, observou-se que o nível de satisfação diminuía com os
serviços prestados após a alta quando comparados com os hospitalares,
principalmente, com relação ao fornecimento de informações sobre o auxílio
financeiro e serviços disponíveis após a alta e suporte ao cuidador no
domicílio(31).
No início, os serviços de suporte oferecidos pelas associações de pacientes,
enfocavam-se muito mais sobre as necessidades do paciente do que da família.
Como podemos perceber, os trabalhos publicados no início da década de 80,
descrevem os objetivos e atividades desses serviços centrados no paciente.
O objetivo dos serviços voluntários de suporte visava oferecer apoio ao
paciente durante a reabilitação e em situações de dificuldades(16), por meio de
orientações, apoio emocional e informações a pessoa com AVC(2).
Esse tipo de assistência unidirecional acabou gerando insatisfações nos
familiares. Isto fica evidente no trabalho de Carnwath & Johnson(32), ao
encontrarem na maioria dos cônjuges, sentindo-se negligenciados e referindo que
pouco tinha sido feito por eles, após seis meses do AVC. Eles argumentavam que
embora existissem Associações de Pessoas com AVC, elas ajudavam muito mais os
pacientes que os cônjuges.
Com esse tipo de assistência, o suporte ficava circunscrito ao paciente, visto
que o acesso dos familiares aos serviços não era privilegiado como meta,
levando os mesmos a se sentirem abandonados(19).
Dessa maneira, recomenda-se na época, que pesquisas fossem feitas para se
descobrir os intervalos das reuniões, bem como as informações que seriam
necessárias para prevenir a depressão entre os cuidadores(32).
Esses dois últimos serviços, geralmente, são tipos de suportes oferecidos pelas
Associações de Pessoas com AVC(25).
O serviço mais apreciado pelos cuidadores era o da enfermeira comunitária e a
ajuda na casa, embora margens de satisfação e insatisfação com o serviço eram
expressas. O hospital-dia e o cuidado-de-folga, promovendo o descanso do
cuidador foram valorizados(19).
Assim pode-se perguntar: - O que pode ser feito para ajudar o cuidador a estar
a altura da crise gerada pelas seqüelas do AVC e ao mesmo tempo tornar possível
que eles atenuem o impacto sobre eles mesmos da incapacidade e distúrbio
comportamental experienciado pelos pacientes?
Embora seja oferecida uma variedade de serviços comunitários à população, como:
serviços de cuidado domiciliar, hospitais-dia, grupos de suporte para pessoas
com AVC e cuidados de folga. Evidenciou-se dados que 80% dos cuidadores
revelaram problemas emocionais e perturbação em suas vidas sociais e metade
experienciou uma redução em seus tempos livres como uma conseqüência direta do
fato de assumirem o cuidado(8). Estas informações levaram as autoras a
ressaltarem que mesmo oferecendo serviços de suporte, está faltando uma
avaliação e conseqüentemente uma implementação assistencial adequada de forma a
atender as necessidades individuais do cuidador.
Outra tentativa de se melhorar a qualidade assistencial ao cuidador se deu com
o serviço de atendimento domiciliar local no Reino Unido. Como não se atendia
às necessidade dos pessoas com AVC e seus cuidadores, a Associação de Pessoas
com AVC junto as autoridades locais resolveram criar um programa conhecido como
Family Support Service Organisers (FSSOs). Este serviço iniciado em Liverpool
por meio de avaliações concluiu que o serviço era benéfico, e assim foi
estendido por toda Inglaterra e País de Gales. Os serviços são equipados pela
Associação e pela instituição compradora dos serviços. Os FSSOs fornecem
suporte emocional para pacientes e familiar. A avaliação deste programa, no
entanto, demonstrou que a maioria dos pacientes não estava bem informada sobre
as causas, natureza ou fatores de risco do AVC, assim parece que as estratégias
de promoção à saúde e organizações tais como a FSSOs ainda não estavam
promovendo informações efetivas(33).
Como recurso didático no processo educativo, encontramos um manual educacional
destinado a pessoas com AVC e seus familiares, sugerido por um grupo de auto-
ajuda, composto por pessoas com AVC e seus familiares que passaram a
encontraram suporte e encorajamento entre os mesmos. Muitos dos membros deste
grupo se sentiam frustrados porque não recebiam informação adequada dos
profissionais de saúde durante a sua recuperação do AVC. O conteúdo foi
desenvolvido em parceria entre sobreviventes de AVC e profissionais da saúde,
tendo o auxílio de um especialista em alfabetização, visto o alto nível de
analfabetismo. Os objetivos eram: a - assegurar que a informação sobre a
recuperação do AVC estava clara e de fácil entendimento; b - promover
informação sobre recursos comunitários na cidade de Newfoundland(Canadá) que
poderiam ajudar a melhorar a qualidade de vida dos pessoas com AVC; c -
promover sugestões e recursos para ajudar a melhorar a qualidade de vida dos
doentes e de seus familiares. O conteúdo do manual aborda desde os sinais e
sintomas de um AVC até o processo de recuperação e reabilitação: descreve o
AVC; papéis dos profissionais de saúde; exames médicos mais comuns; - a
importância do paciente e familiares no processo de recuperação; -
encorajamento das pessoas a conviverem com suas incapacidades; - discutindo os
processos de adaptação física e emocional da pessoa com AVC; - encorajamento à
independência e à auto-satisfação; - recursos disponíveis na comunidade; e a
importância de se usar os recursos da comunidade para aliviar seus estresses.
Aquelas famílias com maiores necessidades de cuidado de suporte são, também, as
mais prováveis a não participarem nos programas, geralmente por problemas
práticos(28).
Outra questão importante é a necessidade que se tem em oferecer um serviço
apropriado para pessoas com AVC que dependem apenas de cuidados paliativos e
que tem recebido pouca atenção.
Pesquisadores afirmam que mais da metade dos cuidadores relatavam que os
pacientes experienciaram dor (65%), confusão mental (51%), distúrbio do humor
(57%) e incontinência urinária (56%) no último ano de vida(34). O controle da
dor foi inadequado, bem como 2/5 tinham sido incapazes de obter todas as
informações que eles desejavam sobre as condições do paciente. De posse destes
dados os autores concluíram que há necessidade de se melhorar o controle de
sintomas e apoio psicossocial às pessoas com AVC que estão fora de
possibilidades terapêuticas são necessários, bem como melhorar o processo de
comunicação entre profissionais da saúde e os familiares, além de trabalhar
está questão junto a graduação médica e de enfermagem.
A literatura demonstra que o apoio de um profissional especializado no cuidado
do familiar de pessoas com AVC melhora a satisfação com o cuidado e em
particular àqueles relacionados à comunicação e suporte. Os dados mostram
resultados positivos na área social e psicológica para ambos, no entanto não
melhora o bem-estar físico do paciente, mostrando-os mais dependentes do que
aqueles que não eram atendidos pelo profissional(35).
4 Considerações finais
Pode-se verificar por meio dos resultados dos trabalhos que exploram o papel
educativo do enfermeiro junto a cuidadores familiares de pessoas com AVC, que
mesmo que estes sujeitos contem com serviços de saúde comunitário e
multidisciplinar voltados ao suporte após a alta hospitalar, aliviando o
processo de sofrimento dos mesmos, na maioria das vezes, os cuidadores
continuam cercados por incertezas, medos e insatisfações.
Por um lado, esse contexto se constitui em um fator motivador a profissionais e
às associações de pessoas acometidas pela doença a continuarem se dedicando a
pesquisas e a propostas de novos modelos assistencias, bem como no oferecimento
de uma literatura de apoio cada vez mais adequada aos cuidadores familiares.
Assim, entende-se haver uma mobilização, voltada a oferecer uma assistência de
suporte que atenda às necessidades integrais dos cuidadores e de seus entes. No
entanto, surge um questionamento: Por mais que se busque atender as
necessidades dos cuidadores, será que haverá um momento que eles se sentirão,
plenamente, satisfeitos com a assistência oferecida?
Esta reflexão se dá num momento em que nos leva a pensar que se alguma
Instituição e ou profissionais tentarem oferecer serviços de apoio dirigidos a
essa população, eles deverão estar abertos aos desafios, pensando que o produto
do processo avaliativo deverá se constituir em estímulo para investigações,
visando a busca de referenciais teóricos norteadores de uma prática
assistencial voltada às reais necessidades dos sujeitos.