Uso de atmosfera controlada para conservação pós-colheita do mamão 'Golden'
COMUNICAÇÃO CIENTÍFICA
COLHEITA E PÓS-COLHEITA
Uso de atmosfera controlada para conservação pós-colheita do mamão 'Golden'1
The use of controlled atmosphere for postharvest conservation of 'Golden'
papaya
Marcos José de Oliveira FonsecaI; Sérgio Agostinho CenciII; Nilton Rocha
LealIII; Neide BotrelII
ID.Sc. Pesquisador - EMBRAPA Milho e Sorgo - Rod. MG 424 km 65, C.P. 151 - Sete
Lagoas/MG - CEP 35701-970 - (31) 3779-1035. mfonseca@cnpms.embrapa.br
IID.Sc. pesquisador - EMBRAPA Agroindústria de Alimentos
IIIPh.D. Professor Titular - Universidade Estadual do Norte Fluminense
As exportações brasileiras de mamão do grupo Solo geraram 18,5 milhões de
dólares de divisas para o Brasil em 2001, contribuindo para o superávit do
agronegócio nacional. Entretanto, as perdas são entrave para a exportação via
marítima, que reduziria o custo do frete, aumentando a competitividade no
mercado mundial. O controle da atmosfera pode ser implantada, a partir do
momento em que se verifique possibilidade de extensão do período de
conservação, sem o comprometimento da qualidade sensorial. Não existem muitos
estudos sobre o uso de atmosfera controlada para o mamão. Kader (1999)
recomenda, para os mamões do grupo Solo, atmosferas de 3 a 5% de O2 e de 5 a 8%
de CO2. O objetivo deste trabalho foi o de estabelecer uma atmosfera controlada
na preservação da qualidade pós-colheita do mamão 'Golden', simulando-se
condições de transporte e comercialização no mercado europeu.
Os frutos de mamoeiro 'Sunrise Solo' foram colhidos no estádio 3 (25 a 40% da
área superficial amarela) da escala de maturação desenvolvida por Balbino
(1997), em pomar comercial localizado em Linhares-ES. Os frutos foram
submetidos à hidrotermia e imersão em calda fungicida, classificados (10 frutos
por caixa), embalados em caixas de papelão tipo exportação e transportados
refrigerados (10o C) para a Embrapa Agroindústria de Alimentos, Rio de Janeiro-
RJ, onde foram submetidos à temperatura de 10o C, 85-95% de umidade relativa, e
a cinco atmosferas (ambiente; 3%O2/3%CO2; 3%O2/6%CO2; 3%O2/8%CO2 e 5%O2/8%CO2).
Foi estabelecido controle em atmosfera ambiente e a umidade relativa de 70%. Os
frutos foram retirados destas condições, após 20 ou 25 dias, período mínimo e
máximo de transporte marítimo. Em seguida, foram submetidos a 22o C, por 12
horas, período correspondente ao deslocamento para o mercado atacadista. Após
isso, os frutos foram mantidos por cinco dias a 10o C, simulando a
comercialização atacadista no mercado europeu. Os frutos foram avaliados nas
condições de comercialização no varejo (25o C), aos 0 e 4 dias, para ambos os
tempos de transporte, quanto às seguintes características: desenvolvimento de
cor de polpa, em relação à escala desenvolvida por Balbino (1997); perda de
massa fresca, em relação à massa inicial; firmeza de polpa, após a remoção da
casca, em quatro pontos eqüidistantes na região mediana, medindo-se a
resistência à penetração da ponteira de penetrômetro tipo EFFEGGI (5/16"),
expressando-se os resultados em kg.m-2.10-4 (Fonseca, 2002); sólidos solúveis
totais (SST), com o uso de refratômetro (ATAGO N1) e valor expresso em oBrix
(Adolfo Lutz, 1985) e acidez titulável (AT) em percentagem de ácido cítrico,
pela titulação de alíquota do suco com solução 0,1N de NaOH, em presença de
fenolftaleína (pH final: 8,0) (Adolfo Lutz, 1985).
Os tratamentos foram dispostos em parcelas subdivididas, em que atmosferas de
armazenamento constituíram as parcelas e as datas de avaliações constituíram as
subparcelas, em delineamento em blocos casualisados, com três repetições. Os
dados foram interpretados por análise de variância e teste de Tukey, a 5% de
probabilidade.
Para o primeiro dia de comercialização varejista (viagem marítima mais curta),
a maior retenção da firmeza foi verificada em mamão 'Golden', armazenado sob
5%O2 e 8%CO2 e 3%O2 e 6%CO2, embora a firmeza destes últimos não diferisse das
observadas nos frutos armazenados sob atmosfera ambiente, independentemente da
umidade relativa (Tabela_1). Após 4 dias, não mais se verificaram diferenças
entre os frutos. Após 25 dias, verificou-se maior firmeza nos frutos
armazenados sob atmosfera ambiente (90% U.R.) e nas atmosferas contendo 3%O2 e
8%CO2 ou 3%CO2. Da mesma forma que nos frutos submetidos à simulação de 20
dias, após 4 dias não se verificou diferença na firmeza de polpa dos frutos.
A perda de massa fresca do mamão 'Golden' não diferiu entre os tratamentos na
simulação de armazenamento por 20 dias (Tabela_2). Com exceção dos frutos
armazenados sob 5%O2 e 8%CO2, a perda de massa foi inferior a 5%. No
armazenamento por 25 dias, também não se verificou diferença na perda de massa
dos frutos. Somente após quatro dias de simulação pode-se observar menor perda
de massa nos frutos armazenados sob atmosfera ambiente e 90% de umidade
relativa. A perda de massa dos frutos não diferiu entre as atmosferas
controladas, nesta data de avaliação. A menor firmeza de polpa e a maior perda
de massa fresca dos frutos armazenados na atmosfera contendo 5% de O2, após 20
dias, podem estar indicando maior respiração e amadurecimento mais acelerado,
em relação aos frutos armazenados sob 3% de O2.
Os sólidos solúveis totais do mamão 'Golden' não diferiram entre os
tratamentos, no período mais longo de armazenamento (25 dias), nas duas datas
avaliadas (0 e 4 dias) (Tabela_3). Possivelmente, os frutos já teriam
completado seu amadurecimento. Por outro lado, verificou-se maiores teores de
sólidos solúveis totais nos frutos armazenados sob atmosfera contendo 3%O2 e
8%CO2, 3%CO2 ou 6%CO2 e atmosfera ambiente (90% U.R.), no primeiro dia de
avaliação, na simulação de 20 dias. Os teores mantiveram-se elevados somente
nos frutos armazenados sob 3%O2 e 3%CO2 ou 6%CO2. Na Tabela_4, não se verificam
diferenças na acidez titulável, podendo-se inferir que não houve redução do
metabolismo dos frutos.
A razão entre sólidos solúveis totais e acidez titulável é uma característica
que reflete a qualidade sensorial de frutos, sendo conhecida também como índice
de maturidade (Agustí, 2000). Na simulação de período mais curto de
armazenamento, foram observados maiores valores desta razão nos frutos
conservados sob atmosfera controlada contendo 3%O2 e 3%CO2 ou 6%CO2, e ambiente
(70% U.R.) (Tabela_5). Esta superioridade somente se manteve na atmosfera
contendo 3%O2 e 6%CO2 e na atmosfera ambiente com 70% de umidade relativa, após
4 dias. Os maiores índices de maturidade encontrados nestas duas datas suportam
que o armazenamento, por 20 dias, em atmosfera contendo 3%O2 e 6%CO2,
proporcionou maior qualidade sensorial ao mamão 'Golden'. A diferenciação entre
tratamentos para este índice deveu-se principalmente ao teor de sólidos
solúveis, sobretudo quanto às atmosferas 3% de O2 e 3% ou 6% de CO2. Verificam-
se poucas diferenças nesta característica, para os frutos armazenados por 25
dias sob controle ou não da atmosfera (Tabela_5).
A não diferenciação da coloração de casca do mamão 'Golden' pode ser devida a
sua cor mais clara em relação a outras cultivares (Tabela_5). Marin & Gomes
(2000) descrevem o cultivar como acentuadamente aclorofilado. Fonseca (2002)
comparando seus teores de clorofila a, b e total, com os do mamão 'Sunrise
Solo', constatou que o mamão 'Golden' possui teores significativamente menores
nos 6 primeiros estádios de maturação, em escala de 1 a 7.
A pouca diferenciação entre os tratamentos pode ser devida à temperatura
adotada para os estudos (consagrada entre os exportadores), suficiente para
reduzir o metabolismo em tamanha magnitude, que o processo respiratório tenha
se mantido em nível de manutenção (Salisbury & Ross, 1992). A menor
disponibilidade de oxigênio pode ter causado anaerobiose, promovendo acúmulo de
etanol que pode estimular biossíntese de etileno, desencadeando a maturação dos
frutos (Burdon et al., 1996). A produção de etanol, apesar de não ter sido
medida, pode ter ocorrido, uma vez que ao se provar a polpa dos frutos,
armazenados sob atmosfera controlada, pode ser verificada a ocorrência de sabor
e aroma desagradáveis.
Apesar das poucas evidências de incremento ou manutenção de qualidade sob
controle da atmosfera, o maior teor de sólidos solúveis do mamão 'Golden'
armazenado sob 3%O2 e 3%CO2, e os maiores índices de maturidade sob 3%O2 e
6%CO2 por 20 dias, qualificam tais atmosferas para estudos mais avançados.
Porém, há a necessidade de que outras características sejam medidas como, por
exemplo, atividade respiratória, produção de etileno e de etanol. A
inexistência de diferenças entre os mamões 'Golden', armazenados por 25 dias,
indica que este período de tempo é longo para a eficiência da tecnologia.
Os autores manifestam seus sinceros agradecimentos a White Martins pelo
fornecimento das misturas gasosas, à Empresa Gaia, pelos frutos e à UENF/
FENORTE pela bolsa de estudos.