Configuração identitária de enfermeiros de um serviço de atendimento móvel de
urgência
INTRODUÇÃO
O estudo da identidade profissional tem se destacado pelas constantes
transformações do mundo contemporâneo e a enfermagem se insere neste contexto.
A conquista progressiva de novas funções, competências, autonomias, refletem a
tentativa de seus agentes em acompanhar padrões de formação cada vez mais
elevados e diferenciados, caracterizando-na como uma profissão em transição. Em
face das constantes mudanças por que vêm passando, sua trajetória identitária
tem-se transformado num empenho pessoal pela construção de uma "identidade
positiva" e na quebra do paradigma de pouca valorização e autonomia
historicamente construídos(1). Neste âmbito, vários autores referem a forte
ligação da identidade histórica do enfermeiro com a relação de gênero
predominantemente feminina, conotação religiosa e pouca valorização
profissional(1-4). A tentativa de demarcação do poder médico no ato médico e a
dicotomia entre o processo de cuidar e o de curar refletem algumas das
indefinições que envolvem a crise de identidade por que vem passando este
profissional(1,3).
No curso destas mudanças, há de se ressaltar o crescimento e a evolução desta
profissão nos últimos anos, tanto pela abertura de espaços não ocupados
anteriormente quanto pelo desenvolvimento de especializações que aprimoram sua
prática(5). Em contrapartida, a incorporação de novas tecnologias, a alteração
dos padrões socioeconômicos e de saúde-doença, e as exigências crescentes da
sociedade por uma melhor assistência, muitas vezes, fazem com que o exercício
de suas funções ultrapasse sua formação acadêmica(1).
Apesar da expansão dos cursos de graduação em Enfermagem e da reformulação
porque seus currículos vêm passando, privilegiando a formação de profissionais
críticos, reflexivos, criativos e com capacidade de liderança, autonomia e
competência técnica(6), eles se encontram, muitas vezes, desvinculados da
realidade prática dos contextos organizacionais. Nesse sentido, como principais
tendências das transformações curriculares, destaca-se: atuação no âmbito pré-
hospitalar; aprendizagem baseada em problemas e evidências;
transdisciplinariedade; e bioética(7).
No que tange à assitência pré-hospitalar brasileira, a crescente demanda de
vítimas de acidentes automobilísticos e de violência inter-pessoal são
protagonistas de um cenário de pouca estruturação e padronização dos serviços
de urgência. Em face desta contingência, o Ministério da Saúde criou a Política
Nacional de Atenção às Urgências, pela Portaria n. 2.048, de 5 de novembro de
2002 com o propósito de melhor definir os serviços já existentes e ampliá-los
em nível nacional(8). Assim, os serviços de urgência e emergência hospitalar,
as unidades básicas de saúde, os ambulatórios, os prontosocorros e os serviços
de atendimento móvel de urgência (SAMU) são contemplados por esta legislação.
Apesar de ser um serviço novo, a importância dos SAMU tem sido destacada,
considerando-se seus impactos positivos no prognóstico dos doentes atendidos
(9).
Observa-se que, em meio a essa nova conjuntura de assistência à saúde nos
serviços de urgência e emergência que, para além da assistência hospitalar, o
atendimento no domicílio e no local de ocorrência dos acidentes e violências é
uma realidade recente no contexto de atuação do enfermeiro.
O crescimento dos SAMU torna evidente a necessidade de formar profissionais
qualificados e, considerando-se sua ampliação em nível nacional, o número de
enfermeiros preparados para atuar nesta área ainda é restrito(10-11).
Acrescente-se o fato de que as urgências não constituem especialidade médica ou
de enfermagem e que a atenção dada nos cursos de graduação ainda é considerada
insuficiente(8).
Considerando-se a pluralidade da equipe que ali trabalha e dos diferentes
contextos de atuação, infere-se que talvez não exista uma só forma de ser
enfermeiro, daí a necessidade deles questionarem a sua própria identidade(1). A
possibilidade de se manifestar como ser e trabalhador no cotidiano de trabalho
estão intimamente relacionadas com a constituição de sua identidade(12).
Importa ressaltar que, apesar do crescimento das áreas de atuação dos
enfermeiros e de todo o arcabouço legal que os rege, falta clareza acerca de
suas atribuições, principalmente em serviços de origem recente, como os SAMUs.
Admite-se que a atuação do enfermeiro contribui sobremaneira para os resultados
do processo de assistência, de gestão de materiais e equipamentos, de
comunicação com outros atores sociais e, consequentemente, da atuação do
próprio SAMU. A forma como ele se percebe neste contexto específico pode
determinar sua atuação. Daí a importância de aprofundar as questões relativas à
sua identidade. A identidade é configurada na percepção de si mesmo (identidade
real) e do outro (identidade virtual) e portanto, apesar do senso de
individualidade, é correlativa ao contexto de atuação, às experiências
cotidianas, à interação e reconhecimento dos demais atores sociais(13). A
comparação perante os membros do grupo social relacional, as relações de poder,
o processo motivacional e a construção de uma autoestima positiva contribuem
para a construção da identidade no trabalho(14).
Portanto, depreende-se que a identidade do enfermeiro assume significados que
dependem do seu papel e do grupo em que está inserido. Assim, pretende-se
especificamente analisar como tem se configurado as identidades real e virtual
do enfermeiro que trabalha especificamente em unidades de suporte avançado de
um SAMU.
REFERENCIAL TEÓRICO
Identidade: algumas perspectivas de análise
A identidade tem sido apresentada como um conceito amplo, complexo, adotado
frequentemente para compreender a inserção do sujeito no mundo e sua relação
com o outro. Associa-se comumente como algo individual, singular, atributo de
caracteres próprios e exclusivos como, por exemplo, a data de nascimento,
filiação e a impressão digital(4).
Apesar da conotação de singularidade, trata-se de um processo dinâmico, em
constante construção e reconstrução(13,15), cujas experiências individuais de
socialização constituem seu principal referencial de formação(16,17). Várias
perspectivas de análise ou níveis de identidade são descritas na literatura e,
apesar de distintas, se complementam.
No tocante à identidade pessoal, envolve a construção do "autoconceito", ou
"conceito de si mesmo", por meio de relacionamentos sociais e do desempenho de
papéis, e ocorre em todas as fases da vida do indivíduo. Já a identidade social
diz respeito à construção do autoconceito dentro de um ou vários grupos e pode
orientá-lo e legitimá-lo mediante o reconhecimento e vinculação social. Quanto
à identidade no trabalho, esta é referenciada como uma construção do eu pela
atividade que o indivíduo realiza e pelas pessoas com quem se relaciona no
trabalho. Ocorre na juventude, na idade adulta e, até mesmo na aposentadoria, e
contribui para a formação de sua identidade pessoal como fator motivacional.
Por último, a identidade organizacional refere-se à construção do conceito de
si vinculado à organização na qual trabalha. "O indivíduo identifica-se com o
grupo ou grupos aos quais pertence, com o trabalho que realiza e com a
organização à qual pertence"(17). No que tange à identidade profissional ou
coletiva, baseia-se em traços ou características comuns a todos que exercem
determinada atividade(4).
Assim, a identidade é um fenômeno que emerge da interação dialética entre
indivíduo e sociedade, num processo de interiorização, em que a pessoa é
introduzida no mundo objetivo de uma sociedade ou setor dela. Apesar de ser
formada por processos sociais, pode ser modificada ou, mesmo, remodelada pelas
suas relações(16). Este processo de socialização inicia-se na infância, na
transmissão de valores pelos pais e parentes mais próximos, pertencentes ao
único mundo perceptível à criança. Nesta, os saberes de base são adquiridos,
por exemplo, a alfabetização, a leitura, linguagem leitura e escrita. A
incorporação desses saberes é mediada pela relação da família com a escola e da
criança com os adultos e assegura a socialização primária e, consequentemente,
a posse subjetiva do eu e seu mundo. Entretanto, o indivíduo só se faz membro
da sociedade a partir da compreensão de seus semelhantes e da "apreensão do
mundo como realidade social dotada de sentido"(16). A inserção do indivíduo em
outros setores, determinados pela divisão do trabalho e da distribuição social
do conhecimento com a aquisição de vocabulários e funções específicas
relacionados ao cotidiano de trabalho, cincunscreve a socialização secundária.
Em decorrência da experiência vivida no cotidiano e no contexto de mudanças que
tem marcado nossas sociedades, a socialização secundária pode ser considerada
como mais volátil que a socialização primária(14). Considera-se que as
identidades são mutáveis ao longo dos tempos e que a reconstrução das
identidades nacionais e éticas no mundo globalizado emerge novos movimentos
sociais(18).
A experiência vivenciada no ambiente de trabalho é fundamental para a formação
das identidades sociais fazendo com que as organizações se tornem espaços
privilegiados de construção de identificações(19). Outro setor considerado como
elemento decisivo no processo de construção identitária é a escola. Nesta,
tenta-se passar ao indivíduo "aquilo que ele deve ser"(1). Todo o exposto
parece desvelar a complexidade do estudo sobre identidade e a diversidade de
perspectivas teóricas para sua análise. Para fundamentar a presente
investigação, optou-se por uma aproximação dos mecanismos de identificação
propostos por Dubar(13) como constituintes fundamentais para analisar as
identidades real e virtual dos enfermeiros no contexto específico de um SAMU.
Este autor(13) parte do pressuposto de que a representação que os outros
possuem do sujeito é fundamental e a constituição do sentido pessoal de
pertença e que este é relevante na configuração identitária. Os valores de seu
grupo relacional são interiorizados e guiam as condutas do indivíduo. Daí, o
sujeito passa a exercer um papel que considera ser útil e reconhecido(13).
Portanto, um dos pontos de partida proposto como estratégia para a análise do
processo de configuração identitária é que, além do indivíduo, seu grupo de
pertença também seja investigado. Propõe-se a estudar não apenas a
representação que o indivíduo possui do seu papel, mas, fundamentalmente, a que
possui do grupo em que se inclui, vista de seu interior(13). O modelo de
análise adotado nesta pesquisa parte do princípio de que o eu é dividido em um
ser individual e um ser social, reflexo de uma dualidade imposta pela sociedade
que implica a articulação entre dois processos identitários heterogêneos. Este
nunca é dado, e, sim, construído e reconstruído(13). A chave do processo de
construção das identidades sociais se dá na articulação entre duas transações:
a objetiva e a subjetiva. A transação objetiva, também denominada "transação
externa"(13), ocorre entre o indivíduo e os outros significativos e visa
acomodar a identidade para si e para o outro. A "transação interna" ao
indivíduo procura assimilar a identidade para o outro à identidade para si.
Também denominada "transação subjetiva", constitui-se no segundo mecanismo
central do processo de socialização concebido como produto de identidades
sociais.
No contexto de trabalho, os indivíduos se vêem obrigados a estabelecer relações
estáveis ou duráveis com seu grupo e com seu chefe, bem como a partilhar
atividades organizacionais, cujo investimento pode implicar o reconhecimento
recíproco destes sujeitos. Portanto, a transação objetiva envolve relações de
poder, normas de comportamento, assim como cultura, afinidades e valores
organizacionais(13). Para identificar a si próprio, o indivíduo utiliza os atos
de pertença, ou seja, categorias de significado que exprimem "que tipo de homem
(ou de mulher) você quer ser". Já a identidade para o outro, ou identidade
virtual, é definida pelas pessoas com que o indivíduo se relaciona, a partir de
categorias que definem que tipo de homem ou mulher você é, ou seja, os atos de
atribuição(13).
Nesses termos, o processo identitário biográfico descrito por Dubar(13) é
definido como uma construção temporal sucessiva de identidades sociais e
profissionais, a partir das categorias oferecidas por instituições como
família, escola, mercado de trabalho e empresa.
O modelo proposto por Dubar(13), cujas análises dos processos de identificação
e das consequentes identidades real (para si) e virtual (para o outro)
convergem na configuração identitária, encontra-se descrito e esquematizado no
Quadro_1.

A transição vivenciada pela saída das instituições de formação e sua relação
com o mercado de trabalho constitui um momento essencial para a construção da
identidade autônoma. Há de se considerar que a identidade profissional de base
pode constituir não só a identidade no trabalho, mas também uma projeção de si
no futuro e a concretização do aprendizado(13). Para legitimar suas capacidades
em um determinado contexto de trabalho, muitas vezes o indivíduo se empenha em
obter certificações e em desenvolver relações de identificação com seus pares.
Uma especialização, por exemplo, pode representar um ato significativo da
identidade virtual e a identificação pelo outro de suas competências(13).
O Serviço de Atendimento Móvel de Urgência e especificidades do profissional
enfermeiro
O atendimento pré-hospitalar nas últimas décadas tem sido amplamente discutido
e remodelado por autoridades de várias esferas governamentais(20).
Regulamentado e assegurado por lei, ele passou por uma série de modificações,
que tiveram como consequência a padronização do serviço em nível nacional. É
uma modalidade de atenção da área da Saúde instituída pelo Ministério da Saúde
e responsabilizada pelo atendimento de pacientes com agravos clínicos,
traumáticos, obstétricos e psiquiátricos. A assistência prestada é desencadeada
por um solicitante via telefone, pelo número gratuito 192, vinculado a uma
Central de Regulação e destina-se ao local de sua ocorrência que, pode ser um
domicílio ou via pública, dentre outros(8).
Apesar das restrições impostas em termos de cobertura da população e das
dificuldades vivenciadas em sua prática, principalmente no que concerne à
disponibilidade de profissionais capacitados, o SAMU responde diariamente por
uma grande demanda de atendimentos e emprega um número crescente de
profissionais. Atualmente, ele é responsável pela maior parte dos
encaminhamentos aos serviços de saúde. Sua rede nacional conta com 144
serviços, que envolvem 1.163 municípios e mais de 100 milhões de usuários
potenciais(21).
O SAMU brasileiro foi baseado na modalidade de atendimento de resgate francês.
Por isso, tem na Central de Regulação de Urgências e Emergências seu "elemento
ordenador e orientador" e no médico da Central de Regulação, seu "sujeito
nuclear"(8). As funções dos profissionais da saúde, bem como de toda a equipe
que trabalha direta ou indiretamente no atendimento pré-hospitalar, só foram
definidas formalmente a partir da Portaria n. 2048 do Ministério da Saúde(8).
Nesses serviços, o enfermeiro, o médico-intervencionista e o motorista-
socorrista compõem a equipe das Unidades de Suporte Avançado de Vida (USA).
Juntos, são responsáveis pelos atendimentos que envolvem procedimentos de maior
complexidade. Esses atendimentos são realizados em domicílios, vias públicas,
instituições hospitalares e durante o transporte dos pacientes. Acredita-se que
nestes atendimentos o enfermeiro pode reafirmar sua condição de enfermeiro
assistencial, contrapondo o cotidiano de trabalho de muitas instituições
hospitalares.
Os profissionais das equipes de saúde que atuam nos serviços de emergência são
peças fundamentais no processo de cuidar. Para tal, atributos como competência,
habilidade motora, criatividade, e sensibilidade são exigidos. Em termos
críticos, o cuidar em emergência exige mais do que conhecimento técnico, ou
seja, conta também com a experiência de seus profissionais, o seu "saber-fazer"
(22).
No caso específico do enfermeiro e de suas práticas no cuidar em situações de
urgência e emergência, destacam-se, dentre as suas funções: a identificação de
sinais e sintomas de gravidade, a interpretação destes, a utilização de todos
os recursos disponíveis e a identificação da possibilidade de transmissão de
doenças infecto-parasitárias para a equipe e para outros clientes, dentre
outras. No que se refere às dificuldades encontradas pelos enfermeiros nos
serviços de atendimento pré-hospitalar, além da falta de experiência e da pouca
formação, destaca-se a adaptação a um novo e diferente ambiente de trabalho e o
confronto com a vulnerabilidade social e situações de violência interpessoal,
inclusive agressões verbais dirigidas aos profissionais de saúde(23). A
experiência prévia em serviços de urgência e a busca por capacitação específica
têm amenizado tais dificuldades(24).
MÉTODO
Procedeu-se a uma pesquisa de caráter qualitativo(25). Seu desenvolvimento teve
como locus o SAMU de um município mineiro, que funciona 24 horas por dia, todos
os dias da semana e que disponibiliza à sua população adscrita 25 unidades de
suporte básico (USB) e 5 unidades de suporte avançado (USA), as quais atuam em
conjunto com o Corpo de Bombeiros, no caso de retirada de vítimas das
ferragens, com a Polícia Militar e a Polícia Rodoviária. Suas unidades estão
localizadas de forma estratégica, considerando-se a distribuição espacial do
município e a facilidade de acesso por vias rápidas.
Atualmente, a equipe de enfermeiros encontra-se subdividida em 5 Unidades de
Suporte Avançado de vida e conta com atuação de aproximadamente 46
profissionais, que trabalham em escala de plantão. A elaboração de suas escalas
considera uma carga horária semanal de trabalho que varia entre 20 e 24 horas
semanais, dependendo do vínculo empregatício, perfazendo uma média de 6 a 9
plantões por mês. Quanto aos sujeitos secundários, a equipe é composta por
aproximadamente 48 médicos, mais de 100 motoristas-socorristas e centenas de
técnicos de enfermagem. Estes últimos compõem apenas as equipes de Suporte
Básico de Vida (SBV) e os motoristas socorristas trabalham tanto nas Unidades
de Suporte Básico (USB) quanto nas Unidades de Suporte Avançado (USA). O médico
trabalha tanto nas USA quanto na Central de Regulação.
As unidades de observação foram constituídas de enfermeiros e não-enfermeiros -
médicos intervencionistas, motoristas socorristas e técnicos de enfermagem - do
SAMU abordado e a unidade de análise foi a identidade de enfermeiros das
unidades de suporte avançado (USA) de vida deste mesmo serviço.
Com base nos pressupostos de Dubar(13), que assinala que a identidade é
configurada na percepção de si mesmo (identidade real) e do outro (identidade
virtual), os enfermeiros que trabalham nas unidades de suporte avançado
constituíram os sujeitos nucleares e os profissionais que trabalham direta ou
indiretamente com eles, os sujeitos secundários ou relacionais.
A coleta de dados se deu por meio de levantamento documental de fontes
internas, de questionários sociodemográficos e de entrevistas com roteiros
estruturados, as quais foram realizadas com enfermeiros e não-enfermeiros, o
que configurou uma triangulação entre dados(26-27).
A análise das entrevistas obedeceu à técnica de Análise de Conteúdo(28).
Sublinha-se que os sujeitos entrevistados foram selecionados aleatoriamente e a
quantidade de entrevistas realizadas obedeceu ao método de saturação de dados,
cujo critério considera a reincidência e relevância dos relatos(28-29).
O projeto desta pesquisa foi aprovado pela gerente do SAMU no qual o estudo foi
realizado e, posteriormente, submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em
Pesquisa da Secretaria Municipal de Saúde a que se encontra vinculado, sob o
protocolo nº 052/2008. Desta forma, objetivou-se atender às exigências da
Resolução 196/96 do Ministério da Saúde, que regulamenta a pesquisa em seres
humanos(30). Aos sujeitos do estudo foi fornecido um Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido, com as devidas informações quanto aos objetivos da
pesquisa, ao anonimato, ao consentimento escrito e à permissão para utilização
do gravador, com o esclarecimento prévio de possíveis dúvidas.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Dados demográficos dos sujeitos
Em termos demográficos, foram entrevistados 20 profissionais, sendo
contabilizados 11 sujeitos nucleares (enfermeiros) e nove secundários (quatro
motoristas-socorristas, três médicos e dois técnicos de enfermagem).
Dentre os 11 sujeitos nucleares, quanto ao sexo, nove são mulheres e dois são
homens. Este resultado corresponde à realidade do grupo de enfermeiros do
serviço, que, no seu conjunto, atualmente, integra um total de 46 enfermeiros,
sendo 42 mulheres (91,3%) e apenas quatro homens (8,7%). Atenta-se para o fato
de que esta característica, profissionais predominatemente do sexo feminino,
diferencia a enfermagem das outras profissões, e exerce grande influência sobre
os papéis profissionais e os relacionamentos interpessoais em seus locais de
trabalho(3).
Ainda sobre os sujeitos nucleares, a faixa etária revela a presença tanto de
profissionais jovens quanto maduros no exercício de suas funções variando entre
26 a 50 anos de idade e tempo de formação acadêmica entre seis a 20 anos de
conclusão.
Quanto ao vínculo institucional, dez dos onze enfermeiros entrevistados
entraram nesta organização via concurso público e quatro deles trabalharam no
modelo anterior à criação do SAMU. Em relação ao tempo de trabalho no SAMU,
42,0% encontram-se na instituição no tempo compreendido entre um a cinco anos;
33,0%, de 11 a 15 anos; 8,0%, de seis a dez anos; e 8,0%, menos de um ano.
No que tange ao grupo dos sujeitos relacionais, a maioria dos participantes é
do sexo masculino (66,6%), possui entre 31 e 40 anos (62,0%) e vínculo
institucional entre seis a dez anos (44,0%). Os médicos são todos concursados e
os motoristas-socorristas são vinculados a uma empresa terceirizada que presta
serviços ao município. Um dos técnicos de enfermagem é concursado e o outro
firmou contrato administrativo de prestação de serviço com esta instituição. A
totalidade dos sujeitos secundários antes de entrar para este SAMU possuía
alguma experiência relacionada à atividade desempenhada. Mas, assim como os
enfermeiros, nunca haviam trabalhado em serviço de atendimento pré-hospitalar.
Serviço de Atendimento Móvel de Urgência: singularidades para os sujeitos
entrevistados
Em linhas gerais, os sujeitos nucleares e secundários desta pesquisa fazem
algumas considerações sobre o SAMU em que trabalham. A este serviço, a maioria
atribui uma assistência especializada e de qualidade, que proporciona aos seus
pacientes a agilidade necessária para preservar suas vidas antes mesmo de serem
encaminhados à unidade hospitalar (E01, E02, E03, E04, E05, E08, E09, E11, E12,
E15, E16, E19, E17, E18, E19, E20).
Os entrevistados verbalizam a consciência quanto a responsabilidade social do
serviço, exemplificada pela oportunidade de se atender qualquer pessoa, de
qualquer classe social. Suas falas, remetem aos aspectos da universalidade de
acesso, na equidade e integralidade na atenção prestada que balizam a
legislação que regulamenta este serviço. Mais do que um traço constante, o
sentimento de satisfação em poder ajudar o próximo (E01, E02, E03, E04, E06,
E08, E09, E11, E12, E13, E15, E16, E17, E18) e em fazer a diferença, a
convivência com os desafios e a imprevisibilidade, mais a busca por
capacitação, parece traduzir-se na identidade da organização e a confundir-se
com a identidade dos diversos grupos sociais(17).
O SAMU, ele satisfaz muito uma coisa da minha personalidade! Eu sou
inquieta e eu gosto de surpresa. Então, nas minhas atividades
profissionais sempre precisei de alguma coisa que fosse um efeito
surpresa. (E03)
A oportunidade de confrontar situações envoltas de vulnerabi-lidade social
marca o depoimento seguinte, quando o entrevistado um paralelo entre a
responsabilidade do serviço com as diretrizes do Sistema Único de Saúde.
[...] eu penso que é a melhor forma de se atender pré-hospitalar. O
SAMU é, nesse aspecto, eu acho que ele é muito bacana, muito bonito,
exatamente porque ele leva o SUS ao cidadão, certo, a qualquer tipo
de cidadão, de uma forma absolutamente equânime e democrática. (E17)
Os sujeitos nucleares e secundários fizeram comparações entre trabalhar em
contexto hospitalar e pré-hospitalar. Dentre as diferenças que mais se destacou
pontuam-se: a estrutura física, o quantitativo de profissionais, materiais e
equipamentos (E04, E05, E15, E16), as variações climáticas (E14, E16), as
interferências do trânsito (E11) e questões relacionadas ao grau de exposição
perante a população (E05, E13, E15, E16). Acrescidos dos riscos ocupacionais
físicos, químicos e biológicos intrínsecos aos serviços de saúde, ficam
expostos às situações de violência interpessoal, tão frequente em seus
contextos de atuação(23).
Outro ponto que marca a fala dos sujeitos é que os profissionais do SAMU não
têm assegurado um horário certo de terminar um plantão, de fazer suas refeições
e nem mesmo de atender suas necessidades de eliminação. O profissional que ali
trabalha deve estar preparado todo o momento para atender pacientes de qualquer
faixa etária (E04, E10, E15, E17).
[...] porque a gente que trabalha na ambulância, a gente pega
qualquer faixa etária. Não tem uma faixa etária: idoso, criança e
jovem, né, adolescente, neném, recém-nascido. Então, você trabalha em
uma faixa etária muito variada. (E14)
A propósito da equipe de enfermagem, um sujeito secundário (E18) citou o
distanciamento do enfermeiro dos demais integrantes da equipe de enfermagem
como uma de suas principais diferenças.
Tem muita diferença. Primeiro pela distância entre a equipe e o
enfermeiro. A equipe do enfermeiro no pré-hospitalar não é a equipe
de enfermagem. A equipe do enfermeiro no pré-hospitalar é o médico e
o motorista. Não tem a enfermagem. Fica separado e no hospital, não.
Fica o enfermeiro coordenando a equipe de enfermagem. Ele representa
a equipe. No pré-hospitalar isso não acontece. (E18)
Apesar do referido distanciamento, o enfermeiro das USA se sentem mais próximos
das atividades assistenciais, diferentemente de outros contextos de atuação.
Esta característica delimita de certa forma um dos traços identitários destes
enfermeiros.
Considerando-se que o percurso de vida do indivíduo e sua consequente
trajetória profissional permitem moldar sua identidade(13), alguns aspectos da
trajetória profissional dos sujeitos nucleares subsidiaram a categoria de
análise seguinte.
Percurso da trajetória profissional de enfermeiros de um SAMU
A maioria dos enfermeiros entrevistados revela que tiveram contato com a
assistência a pacientes críticos na época da graduação em Enfermagem,
principalmente nos estágios extracurriculares, quando vivenciaram o processo de
socialização e consequente identificação(16).
Eu comecei muito cedo na urgência e emergência. É um serviço que
desde o princípio eu me identifiquei muito com ele, então eu comecei
como acadêmica. (E04)
Quando solicitados a falar sobre sua trajetória profissional, cinco dos onze
enfermeiros deixou claro que a opção pelo curso de enfermagem foi uma
alternativa em função de diversas dificuldades em frequentar o curso de sua
primeira opção. Dentre as dificuldades, pontuam-se a presunção de uma condição
financeira insuficiente e a não aprovação no curso de sua primeira opção.
Alguns dos entrevistados revelaram que quando entraram na faculdade nem sabiam
o que era ser enfermeiro. Todavia, apesar do desconhecimento inicial em relação
à profissão, da falta de sentido vocacional e até mesmo da reprovação da
família pela escolha, uma relação afetiva foi estabelecida já durante o
processo de socialização ocorrido ainda na academia(13,16,19).
Eu gosto muito do que eu faço. Assim, sou enfermeira com muito
orgulho de saber se meu pai também acha assim muito legal. Acho muito
chique. Antes ele não aceitava, no começo, né. Acho também que pelo
desconhecimento do também da profissão. Mas hoje, não; ele tem o
maior orgulho de falar: "ah, minha filha é enfermeira, ah, minha
filha faz doutorado". Então, assim sai contando para todo mundo,
porque ele gosta muito de falar quando está entre amigos. Então, para
mim, eu me sinto realizada também profissionalmente e não me sinto
nem um pouco depreciada. Não me sinto menor por não ter feito
medicina. Muito pelo contrário; me sinto até mais capacitada porque a
gente tem um olhar além do que simplesmente a doença, né. Então, eu
gosto muito do que eu faço. (E10)
Quando indagados sobre como aprenderam a ser enfermeiro, os entrevistados
confirmaram que a identidade profissional só se constrói na prática, nos
contextos que permitem identificação com modelos de conduta e a comparação
entre os pares relacionais(19). A busca de uma identidade por meio da
comparação com os membros do grupo social relacional(14,19) aparece na fala de
um enfermeiro entrevistado (E03).
Você tem que pensar rápido. Você tem que ter capacidade manual. Você
tem que ter discernimento e tem que estar preparado do ponto de vista
emocional. Você tem que ter habilidade técnica. Você tem que ter um
coeficiente intelectual muito bom. E as nossas colegas investem muito
nisso. Eu acho que as nossas colegas são as ideais. Eu não convivi
com as outras. Eu não convivo com você e eu não convivo com as
outras. Excepcionalmente, eu vejo alguém, mas as que iniciaram o
sistema são ideais, né? (E03)
A maior parte dos sujeitos nucleares (E01, E04, E06, E07, E10, E15) afirma que
os conhecimentos fornecidos na graduação em enfermagem foram insuficientes para
as exigências dos serviços de urgência, principalmente no que tange ao SAMU. Os
entrevistados referem que após a prestação de cuidados, a troca de experiência,
assim como o vocabulário específico ao cotidiano de trabalho, muitas vezes, é
dividido informalmente entre os colegas (E01, E03, E07, E13, E15). Esse
aprendizado constante que emerge na fala dos entrevistados faz parte da
socialização secundária condicionada às relações de trabalho de um determinado
contexto(16).
O fato de executarem um serviço interessante e desafiador motivou a maioria dos
sujeitos nucleares (E01, E03, E05, E06, E09, E11, E15) a ingressar no SAMU. Em
contrapartida, a dificuldade em fazer parte deste grupo e a pouca receptividade
de alguns colegas enfermeiros veteranos foram enfatizadas por quatro
enfermeiros entrevistados (E01, E10, E13, E15).
Identidade real e virtual dos enfermeiros de um SAMU
Na percepção da maioria dos entrevistados, para ser enfermeiro do SAMU o
profissional deve, além de gostar de trabalhar com urgência (E04, E05, E06,
E07, E08, E12, E18), estar sempre se aperfeiçoando (E02, E03, E04, E06, E07,
E10, E12, E14, E15, E17, E19, E20). Além de possuir experiência e habilidade
técnica (E03, E05, E07, E10, E11, E13, E20), deve ter boa vontade e interesse
em crescer (E09, E10, E11, E13, E16, E17, E18, E20), demonstrar dedicação e
compromisso com o serviço (E02, E05, E08, E12, E16), agilidade e objetividade
na avaliação dos pacientes e na realização de procedimentos (E03, E06, E08,
E12, E13, E14, E15). Também, deve ter autocontrole (E01, E03, E09, E10, E12,
E14, E15, E16, E20) e adaptar-se às adversidades e aos diferentes locais de
atendimento e com os colegas da equipe de trabalho (E05, E08).
Os procedimentos assistenciais de maior complexidade e a organização do cenário
de cuidar constituem as principais atividades desenvolvidas pelos enfermeiros
em seu cotidiano de trabalho.
Você recebe o plantão do colega, você confere a ambulância, confere
os materiais. Antes vê se realmente está tudo em ordem. É, realmente,
você aguarda, você estuda, você lê, você descansa e você aguarda até
que tenha chamado. No momento em que tenha chamado você se entrega de
corpo e alma. Então, você, de você tudo dá para aquele momento. (E15)
Os atos de pertença descritos pelos sujeitos nucleares apontam para uma
identidade real(13), caracterizada por um profissional que conhece a forma
global das ações desempenhadas no SAMU, participa dela, gosta do serviço e das
atividades que realiza e está sempre buscando capacitação e o aperfeiçoamento
profissional. Ele se cobra muito e se desdobra para superar e adaptar-se às
adversidades peculiares das atividades do SAMU. A proximidade com as práticas
assistenciais e a oportunidade de não delegá-las a outros membros da equipe
constituem suas diferenciações.
Observe-se que um enfermeiro (E01) se sente realmente como tal por poder
assistir diretamente o paciente e por não ter de se envolver tanto com as
questões burocráticas frequentemente associadas ao contexto hospitalar.
A gente é muito enfermeiro mesmo, né? Quando você trabalha, você que
tem que fazer. Então, você realmente é enfermeira. Você lida com o
paciente o tempo inteiro. Então, você não se perde em coisas
burocráticas. (...) Se você trabalha em um ambiente hospitalar, você
está preocupado com outras coisas, mas quando você vai para um
ocorrência efetivamente, você é o enfermeiro. Você lida diretamente.
(E01)
A apropriação de valores do grupo quanto dos processos de identificação e
comparação entre membros traduz a transação subjetiva na busca por uma
identidade percebida como positiva de pertencimento e reconhecimento
profissional. Apesar de se constituir um serviço novo, a experiência
profissional é correlacio-nada a um ato de pertença por seus membros(13).
Seguindo a lógica de se tentar conhecer o enfermeiro sob a perspectiva de seus
sujeitos relacionais, perguntou-se aos sujeitos secundários como é, de fato, o
profissional enfermeiro que trabalha no SAMU. Considerando-se seus relatos, a
identidade virtual destes atores sociais pode ser caracterizada por
profissionais diferenciados (E20), experientes (E09, E12, E20), conhecem tudo
da unidade (E09, E17, E20) e estão sempre envolvidos com questões relativas ao
aprendizado e à capacitação (E12, E20). Estes atos de atribuição reafirmam a
proposição de que a enfermagem é uma profissão em transição, na qual seus
agentes buscam conquistar progressivamente novas funções, competências e
autonomia, e tentam acompanhar padrões de formação cada vez mais elevados e
diferenciados(1).
[...] são enfermeiros diferenciados e que correm muito atrás. Eu vejo
quase todos os enfermeiros da equipe. Eu acho que isso é bom porque
vai contagiando. Quase todos correm atrás de mestrado, de doutorado.
Quase todos são professores. Então isso é muito importante. Então,
quando eu estou em contato com o auxiliar de enfermagem em outros
locais, em outros serviços, todos elogiam, porque a maioria são
alunos desses profissionais. Então, isso é muito bom. Então, como a
maioria já tem esse ritmo de vida, quando entra um outro a tendência
de ele falar: "espera aí, para mim não sair dessa, que tem de ser bom
igual aos outros". Então, eu acho admiro isso de eles estarem sempre
correndo atrás de estudar isso e aquilo. (E20)
Por outro lado, os sujeitos relacionais definem enfermeiro do SAMU como um
profissional solitário, de pouco relacionamento, tanto com os técnicos de
enfermagem quanto com os demais enfermeiros. Assim como na identidade virtual,
os enfermeiros afirmaram fazer parte de um grupo grande, cujos membros estão
distantes, principalmente quando se trata de equipes diferentes, sendo que a
solidão foi associada ao crescimento do serviço e à forma descentralizada de
organização. A estes fatores, acrescenta-se a tomada de decisões de forma
verticalizada e ao gerenciamento distante que se apresenta como uma
característica marcante deste serviço (E05, E13).
O enfermeiro ele fica muito sozinho. É um enfermeiro no plantão de
12h e um enfermeiro de uma USA. Ele não tem contato com o enfermeiro
da outra USA, porque elas ficam em bases diferentes e normalmente a
referência de enfermagem do plantão ter um enfermeiro que fica na
Central, na Unidade de Suporte Avançado da USA 01 e os enfermeiros
que ficam nas outras USAs eles encontram uns com os outros por acaso
na Central de Regulação quando vai repor material ou nos hospitais
quando alguém está levando vítima e encontra com outro colega ou
passagem de plantão. Então, o enfermeiro passa o plantão para o
colega fala que é que aconteceu no plantão, do que é que precisa
repor. Mas, assim, a relação é muito distante. Então, não digo que é
amigo, é lógico que não. É profissional, mas é muito distante o
enfermeiro. (...) A equipe de enfermagem fica assim, um enfermeiro em
cada plantão, isolado, segue separado, um gelo, uma pedrinha de gelo
em cada plantão! A equipe de técnicos de enfermagem lá longe na USB
não sabe nem o nome do enfermeiro que está de plantão. (E18)
Note-se, ainda, que as relações de trabalho são marcadas pelas relações de
gênero e de poder, pela cooperação na superação de dificuldades, pela troca de
conhecimento com profissionais menos experientes e pela busca por
reconhecimento recíproco, caracterizando as transações objetivas, que
configuram a identidade virtual do enfermeiro deste SAMU(13).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados desta pesquisa apontam para um projeto identitário de
reconhecimento entre seus membros no qual os enfermeiros frequentemente se veem
obrigados a adotar padrões de comportamento direcionados a preencher a
expectativa do outro. O reconhecimento recíproco almejado é conciliado no dia a
dia de um trabalho visto como prazeroso e, ao mesmo tempo, difícil. Fica claro
que não basta dominar os saberes teóricos adquiridos nos cursos de capacitação
e aperfeiçoamento. O contato com a realidade e a aprendizagem construída
diariamente no SAMU com a troca de experiências exercem papel fundamental na
construção identitária destes enfermeiros. Os sujeitos nucleares consideram
importante ter um conhecimento mais nivelado, que, muitas vezes, é dividido com
profissionais médicos menos experientes, contribuindo, assim, para uma conduta
mais assertiva, com seu processo de aprendizado e também com uma contribuição
diferenciada para a construção de um projeto identitário peculiar nesse espaço
de trabalho.
Foram encontradas divergências nos relatos quanto às questões associadas aos
relacionamentos entre os enfermeiros e os demais integrantes do SAMU. Apesar da
conotação de tranquilidade e da integração ressaltadas por alguns, outros
depoimentos revelaram a existência de conflitos referentes às trajetórias
destes profissionais e que influenciam sobremaneira seu processo identitário
neste contexto de atuação.
Espera-se que os resultados deste trabalho contribuam para que enfermeiros e
outros membros da equipe de saúde reflitam sobre sua prática, principalmente no
que concerne às relações de trabalho que têm desenvolvido diariamente. Note-se
que os discursos sinalizaram para a necessidade de relações hierárquicas mais
horizontalizadas e de realização de reuniões mais frequentes, não apenas de
cunho administrativo, mas também científico e de integração.
Diante da escolha, limitante por definição, de um determinado SAMU para
realização da pesquisa apresentada, da ampliação de frentes de trabalho do
próprio SAMU e das perspectivas pessimistas de futuro verbalizadas por alguns
enfermeiros em face das constantes transformações pelas quais vêm passando sua
profissão, acrescidas das relações de poder reveladas e da luta pela quebra do
paradigma de pouca autonomia e valorização profissional, sugere-se que
pesquisas que abordem e relacionem tais temáticas possam ser desenvolvidas em
contextos similares de atuação destes - os enfermeiros - e outros profissionais
da saúde.