Capacitação teórica do enfermeiro para o atendimento da parada
cardiorrespiratória
INTRODUÇÃO
Os profissionais da área de saúde deparam-se constantemente com situações que
requerem atuação imediata e rápida, pois envolvem risco para o paciente. A
parada cardiorrespiratória (PCR) é um dos exemplos, uma vez que a chance de
sobrevivência após o evento varia de 2% a 49% dependendo do ritmo cardíaco
inicial e do início precoce da reanimação(1).
Com o progressivo aumento na frequência da PCR em áreas não críticas, há
necessidade de capacitação de todos os profissionais de saúde, pois a
sobrevivência do paciente depende da competência e instituição imediata das
manobras de ressuscitação cardiopulmonar (RCP)(2).
Considerando que na maioria das vezes o enfermeiro é o membro da equipe que
primeiro se depara com a situação de PCR(3-5), este precisa possuir
conhecimentos sobre atendimento de emergência, com tomada de decisões rápidas,
avaliação de prioridades e estabelecimento de ações imediatas(4,6).
Na formação do enfermeiro, os conteúdos teóricos e práticos relacionados à PCR
e manobras de RCP têm sido ministrados de forma superficial, limitados, e
muitas vezes não supre as necessidades dos alunos(7). As dificuldades
refletirão na prática do enfermeiro, pois só a experiência profissional não
oferece subsídios e embasamentos teóricos suficientes para suprir este déficit
(8).
Os programas de capacitação que existem são destinados aos profissionais
médicos, enfermeiros e paramédicos(9), principalmente os que trabalham e se
deparam com situações de urgência e emergência. Também há os de preparação de
profissionais para atuarem como instrutores ou auditores de cursos(10).
Um estudo do final da década de 90 constatou que houve diversificação entre os
tipos de cursos, tempos destinados à teoria e à prática e à categoria
profissional mais participativa. Os enfermeiros foram os profissionais que mais
receberam treinamento em suporte básico (SBV) ou suporte avançado de vida
(SAV), ou em ambos(3).
O treinamento das manobras de RCP deve estar voltado para a aquisição de
conhecimento teórico, habilidades práticas e atitudes dos profissionais,
trabalhados concomitantemente, e dentro do contexto da prática dos
participantes, para facilitar sua atuação(3, 5). A padronização das condutas na
RCP ajuda na adoção de linguagem única dos profissionais de saúde para executar
as manobras com eficácia(11).
Os cursos de SBV e SAV são oferecidos regularmente no Brasil, hoje, sob a
permissão e supervisão da American Heart Association, propiciando o
conhecimento com tecnologia adequada e certificação da atuação dos
profissionais, porém, muitas vezes, estão fora das possibilidades financeiras
dos interessados.
Propor, então, um programa de capacitação do enfermeiro para o atendimento da
PCR/RCP é aproximar da sua realidade prática os conhecimentos que estão sendo
produzidos a respeito do assunto, e também contribuir para que haja uma
padronização e uniformização do atendimento da PCR/RCP na instituição
pesquisada.
Em um estudo(12) os profissionais demonstraram a preocupação em corresponder
com os avanços tecnológicos nos serviços de saúde e com isso a necessidade de
educação no trabalho ligada às demandas de atualização profissional.
Diante do exposto, o objetivo principal deste estudo foi elaborar e aplicar um
programa de capacitação teórica para o enfermeiro na PCR/RCP e comparar o
conhecimento do grupo-A-controle com o grupo-B-experimental.
MÉTODOS
Tratou-se de uma investigação prospectiva, intervencionista e comparativa
realizada em um hospital escola do interior do Estado de São Paulo, com 402
leitos, de atendimento terciário e quaternário.
A população foi constituida pelos enfermeiros dos períodos manhã, tarde e
noite, das diversas unidades de internação do hospital, totalizando 285
profissionais. Foram incluídos na amostra 59 sujeitos, sendo 21 no grupo
controle (grupo A) e 38 no experimental (grupo B). Os critérios de inclusão
foram: concordância em participar e possuir no mínimo um ano de atividade na
Unidade atual de trabalho. Os de exclusão foram: enfermeiros afastados devido a
férias ou licença médica no período da coleta de dados e os atuantes na
pediatria. Os critérios de descontinuidade foram: enfermeiros que se ausentaram
por algum motivo de uma das três etapas da pesquisa.
Para a coleta dos dados utilizou-se um instrumento contendo duas partes: parte
A - dados de identificação e caracterização dos enfermeiros; parte B -
questionário abordando o conteúdo sobre PCR/RCP, adaptado do instrumento
elaborado por CAPOVILLA(7), acrescido de quatro questões (n° 3, 5, 16 e 17),
totalizando 17. As perguntas foram dispostas em seqüência lógica e compatível
com as DIRETRIZES-2000 do atendimento da PCR. Nas etapas II e III foi
acrescida, no instrumento, a questão n°18, referente ao contato dos sujeitos,
de ambos os grupos, com a PCR. Um roteiro explicativo do instrumento com
descrição dos itens, questões e conteúdos das respostas foi criado para
utilização dos pesquisadores.
O programa de capacitação foi executado em três etapas denominadas: Etapa I:
avaliação prévia e capacitação teórica dos enfermeiros; Etapa II: avaliação
teórica recente; e Etapa III: avaliação teórica tardia. As etapas I e II foram
realizadas em seqüência, com intervalos de uma semana, e a etapa III após três
meses da etapa II.
A capacitação teórica contemplou três momentos, a saber: 1º Momento:
sensibilização (grupo B, 30 min); 2º Momento: aplicação do instrumento (Grupos
A e B, 30min); e 3º Momento: aula expositiva (Grupo B, 2h). No primeiro momento
foi abordado, para o grupo B, alguns aspectos relacionados à PCR/RCP, a fim de
introduzí-los no assunto. O segundo foi para responder às questões (Grupos A e
B). A abordagem do conteúdo teórico seguiu a seqüência do atendimento da PCR,
para facilitar sua compreensão (grupo-B, experimental), apresentados com
recurso multimídia, que tiveram como títulos os tópicos referentes a cada
questão.
Decorrida uma semana, foi realizada a etapa II, e, após três meses, a etapa
III, que consistiram de uma reavaliação com a reaplicação do questionário para
ambos os grupos. Os instrumentos foram identificados segundo denominação
previamente estabelecida. Essas atividades foram realizadas nas dependências do
Hospital.
As respostas obtidas foram consideradas corretas quando todos os conteúdos
mínimos foram descritos e/ou assinalados; parcialmente corretas quando um ou
mais conteúdos mínimos não foram descritos e/ou assinalados; e incorretas
quando nenhum dos conteúdos mínimos foi descrito e/ou assinalado.
Foi dado a cada questão o valor de um ponto, totalizando 16 pontos. As questões
de nº 17 e 18 não foram consideradas para efeitos de pontuação. Nas questões
com mais de uma alternativa correta, dividiu-se o valor 1 pelo número de
alternativas, excluindo-se as não sei e outras respostas, para se obter o valor
de cada uma delas. As respostas das questões dissertativas (nº 7 e 14) foram
divididas em partes, e a cada uma atribuiu-se a fração do valor em relação ao
valor total da questão. Com a obtenção do número de pontos, realizou-se a regra
de três para transformá-los em nota com valores de zero a dez.
Os dados das três aplicações do instrumento foram tabulados. Na comparação das
variáveis categóricas entre os grupos utilizaram-se os testes Qui-Quadrado e
exato de Fisher. Para as variáveis contínuas aplicou-se o teste de Mann-
Whitney. Para analisar a evolução dos escores entre as etapas e os grupos foi
utilizada a análise de variância (ANOVA). O teste de Tukey foi utilizado na
comparação entre os grupos em cada tempo, e o teste de perfil por contraste
para a comparação das medidas entre os tempos. O nível de significância adotado
foi de 5% (p<0,05).
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição sob
parecer nº415/2004 e os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre
e Esclarecido.
RESULTADOS
Observou-se uma predominância do sexo feminino em ambos os grupos (17/21 no
grupo A e 32/38 no B; p=NS). A faixa etária predominante esteve entre 30-39
anos (11/21 no grupo A e 15/38 no B; p=NS). A média de idade, em anos, no grupo
A foi 40,6±7,9 e no B 37,7±7,1 (p=NS). As instituições de formação dos
participantes foram as seguintes: Faculdade de Enfermagem de Araras (9/21);
Unicamp (3/21), PUC-Campinas (2/21) e outras (7/21) no grupo A. No grupo B,
foram: PUC-Campinas (11/38), Unicamp e Araras (8/38 cada) e outras instituições
(11/38).
Quanto à pós-graduação (latu sensu), 11/21 no grupo A e 16/38 no grupo B
referiram ter curso de especialização (p=NS). Em relação à participação nos
cursos de SBV e SAV, verificou-se que uma minoria do grupo A relatou ter
participado: SBV (2/21) e SAV (1/21), assim como no B, SBV (9/38) e SAV (5/38)
(p=NS).
No grupo A, houve maior participação no programa de capacitação dos enfermeiros
da Emergência Clínica (EC)/Cirurgia do Trauma (CT)/TMO/ Psiquiatria (9/21), do
Serviço de Médico-Cirúrgica (SEMC) II (5/21); o SEMC I, Unidade de Emergência
Referenciada (UER) e Unidade de Terapia Intensiva (UTI) (2/21) cada, e o centro
cirúrgico (1/21). O grupo B apresentou maior variação de participação sendo:
SEMC I (13/38); SEMC II (10/38); EC/CT/TMO/Psiquiatria (7/38); UER (5/38); UTI
(2/38) e radioterapia (1/38).
Em relação à abordagem sobre já ter atuado em outra Unidade na Instituição, 11/
21 dos enfermeiros do grupo A e 18/38 do B, responderam afirmativamente.
A distribuição dos enfermeiros por turno de trabalho e se trabalhavam em outras
instituições apontou, sobre o primeiro aspecto, um maior índice de participação
do noturno nos grupos A (11/21) e B (17/38). Os do turno da tarde foram 7/21 no
A e 12/38 no B. Os do turno manhã apresentaram menor índice de participação, 3/
21 no A e 9/38 no B (p=NS). Quanto ao segundo aspecto, no grupo A obteve-se 11/
21 e no B 18/38 de respostas sim (p=NS).
Para a análise comparativa dos locais de maior e menor incidência de PCR foram
agrupados os serviços de cardiologia/pneumologia, EC/CT, UTI e UER como local 1
(maior), e, os demais, como local 2 (menor). Observou-se que no grupo A 10/21
referiram trabalhar no local 1 e 11/21 no local 2. No B, 15/38 referiram local
1 e 23/38 local 2 (p=NS).
Sobre atualização em PCR/RCP, 3/21 enfermeiros no grupo A referiram ter se
atualizado há 21±24 meses. No grupo B, 16/38 referiram ter se atualizado há
39±34 meses (p=0,275-Mann-Whitney). Com relação ao envolvimento em situações de
PCR/RCP, observou-se que 13/21 enfermeiros do grupo A e 14/38 do B referem raro
contato, e, respectivamente, 8/21 e 24/38 contato freqüente (p=0,041-Qui-
Quadrado). As formas de atualização dos sujeitos do grupo A foram: a leitura de
livros (9/13), palestras (6/13), aulas (6/13), cursos (4/13), leituras em
periódicos (1/13) e outras formas (2/13). No grupo B, os livros e palestras
foram 14/28 cada, aulas (11/28), periódicos (8/28), cursos (9/28) e 3/28 de
outras formas.
As variáveis: tempo de formação, trabalho na unidade e na instituição, de
realização dos cursos de SBV/SAV e da última atualização sobre PCR dos
participantes dos grupos A e B foram semelhantes entre si (p>0,05-Mann-
Whitney).
Com relação ao tempo de formado, um sujeito do grupo A não respondeu. Dos 20
restantes, a média (em meses) foi 144±67 e no B, 144±74. A média do tempo de
trabalho (em meses) na unidade foi de 88±51 no grupo A e 88±63 no B. O tempo de
trabalho na instituição obteve média de 128±71 meses no grupo A e 125±78 no B
(p=NS).
Quanto à participação em cursos, dois respondentes do grupo A realizaram o SBV
há dois anos, e um participante fez referência à realização do SAV. No B, nove
sujeitos realizaram o SBV, com tempo médio de 93±71 meses, e cinco realizaram o
SAV, com média de tempo de 89±32 meses.
O comportamento das respostas das 18 questões do instrumento conhecimento
teórico, nas três etapas do estudo, de ambos os grupos, foram agrupados em três
grandes blocos, descritos no Quadro_1.
Na questão 1, sobre detecção da PCR, nos enfermeiros do grupo A houve um
aumento de respostas C das etapas I e II (52%) para a III (71%). No grupo B, o
percentual de C foi 45% na etapa I, com aumento expressivo destas nas etapas II
e III, 82% e 84%, respectivamente (B > A na etapa II; p=0,018-Qui - Quadrado).
Em relação às condutas imediatas a serem tomadas após o diagnóstico da PCR,
questão 2, os grupo A e B apresentaram aumento de respostas C da etapa I à III,
porém sem diferenças significativas entre eles (p>0,05).
Sobre os padrões de ritmos na PCR, questão 3, nas três etapas o grupo A obteve
baixos percentuais de C. No grupo B, houve aumento de respostas C da etapa I
(32%) para as II e III (87% e 76%, respectivamente; grupo B > A nas etapas II e
III; p<0,001 e p=0,002).
Quanto ao SBV, questão 4, verificou-se, no grupo A, baixas percentagens de
respostas C nas três etapas (5% a 14%). No grupo B, apesar de poucas respostas
C na etapa I (19%), na etapa II houve um maior equilíbrio entre as C e PC (53%
vs 47%), assim como na III (50% para ambas) (respostas C do grupo B > A, nas
etapas II e III; p<0,001 e p=0,007, respectivamente).
Na questão 5, sobre o SAV, o grupo A, na etapa I, obteve 29% de C, que se
manteve na II, aumentando para 48% na III. No grupo B, etapa I, houve 24% de C,
com aumento destas para 66% nas etapas II e III (respostas C no grupo B > A na
etapa II; p=0,006), conforme apresentados no Quadro_2.
Sobre as possíveis maneiras de se ventilar o paciente durante a RCP, questão 6,
mostrou, no grupo A, uma baixa porcentagem de respostas C (<10%) e que foram
semelhantes nas três etapas. No grupo B, na etapa II houve aumento discreto das
respostas C em relação à etapa I (34% vs 8%), diminuindo novamente na etapa III
(26%) (respostas corretas grupo B > A na etapa II; p=0,002).
Como e onde posicionar as mãos para realizar a compressão torácia externa
(CTE), questão 7, apesar de elevada manifestação de sim em relação ao saber,
não foram dadas respostas C pelos sujeitos do grupo A e poucas do B, nas três
etapas. As respostas PC foram predominantes (66 a 87%) nos dois grupos nas três
etapas (p=NS).
Na questão 8, como deve ser a postura corporal para a realização da CTE, as
respostas C nas três etapas, no grupo A, foram: 48%, 67% e 57%,
respectivamente, e, no B, estas foram de 50%, 82% e 71% (p=NS).
Quanto à abordagem sobre a posição utilizada para colocação dos eletrodos (pás)
na desfibrilação (questão 9), ambos os grupos apresentaram elevado número de
respostas C, sendo, no grupo A, de 90% nas etapas I e II e 86% na III. O
desempenho do B foi de 87%, 95% e 100%, respectivamente (B > A na etapa III;
p=0,041).
Os resultados obtidos na questão 10, relacionado à carga inicial para
desfibrilação, foram, nas três etapas, no grupo A, 86%, 81% e 71% de corretas,
respectivamente, e, no B, 79%, 100% e 89% (B > A na etapa II; p=0,013).
Sobre a carga máxima para desfibrilação (questão 11), no grupo A, apontou 67%
de respostas C nas etapas I e II, e 71% na III. No grupo B, obteve-se 53% de C
na etapa I, com aumento importante na II (97%) e discreta diminuição na III
(89%) (B > A na etapa II; p=0,002) (Quadro_3).
As respostas corretas sobre as vias que podem ser utilizadas para administração
de fármacos na RCP, questão 12, apresentaram diferença significativa entre os
grupos na etapa II (B > A; p<0,001).
A questão 13, relacionada aos fármacos utilizados na PCR, mostrou baixo índice
de corretas (<10%) no grupo A nas três etapas. No B, etapa I, não houve
resposta C, e, nas outras etapas, não atingiram 50% (B > A, etapas II e III;
p=0,002 e p=0,024, respectivamente).
Na primeira parte da questão 14 (sim e não), sobre o conhecimento da finalidade
dos fármacos da questão anterior, dos sujeitos do grupo A, 43% responderam
conhecer na etapa I, 62% na II e 43% na III. No B, 53% na I, 45% na II e 58% na
III. Entretanto, na descritiva verificou-se que praticamente não houve
respostas corretas nas três etapas em ambos os grupos.
O conteúdo dos registros de enfermagem na PCR, questão 15, no grupo A, obteve-
se respostas C de 19%, 24% e 48%, nas etapas I, II e III, respectivamente. No
grupo B, as respostas C foram 58%, 76% e 71% (B > A, etapas I e II; p=0,008 e
p<0,001, respectivamente).
Em relação ao conteúdo do carrinho de emergência (questão 16), observou-se no A
que as respostas C foram 38% na etapa I e atingiram 62% na III; já, no B, na I,
estas iniciaram com 34%, atingiram 84% na II, caindo para 74% na III (B > A na
etapa II; p=0,007).
A questão 17, sobre o responsável pela checagem do carrinho, evidenciou no
grupo A que 62% dos participantes na etapa I consideraram como sendo o
enfermeiro, caindo para 43% na etapa III. No grupo B, iniciaram com 42%
atingiram 66% na II e 58% na III (p=NS).

Na questão 18, perguntava-se da busca de informação sobre PCR aos sujeitos do
A, e do contato com a PCR aos do B após participar do programa de capacitação,
na etapa III. Apenas 14% dos sujeitos do A responderam sim para a busca na
etapa II, e 48% na III. No grupo B, 63% mencionaram contato, e, destes, 55%
consideraram seu atendimento satisfatório, 8% pouco e 37% não satisfatório.
A Fgura 1 mostra o efeito interação das notas do conhecimento teórico sobre
PCR/RCP entre os grupos nas três etapas. Observa-se que os sujeitos do grupo B,
apresentaram aumento significativo na etapa II, leve queda na III, decorridos
três meses; ao passo que os do grupo A apresentaram nas etapas II e III
discreto aumento.
Os dados da Tabela_1 demonstram o comportamento das médias das notas, nas três
etapas de ambos os grupos. Os sujeitos do grupo B obtiveram melhora no
desempenho em relação ao grupo A (p<0,001-Tukey).
Houve diferenças, no grupo A, entre as etapas I e III (p<0,004) e etapas II e
III (p=0,010). No grupo B, houve diferenças entre as etapas I e II (p<0,001); I
e III (p<0,001) e II e III (p=0,005; Teste de Perfil).
DISCUSSÃO
O critério de avaliação adotado para a correção das alternativas do instrumento
de coleta dos dados teve como base as Diretrizes-2000, uma vez que era a
vigente no período da elaboração e aplicação do instrumento. No entanto, a
discussão apontará também as alterações presentes nas Diretrizes-2005.
Este estudo reforçou a importância e benefícios conquistados com a realização
do curso para a capacitação de enfermeiros, como mostraram os dados.
Observou-se também que em relação à detecção da PCR ambos os grupos, A e B
apresentaram percentuais próximos de 50% na etapa I, com aumento nas etapas II
e III de respostas corretas, demonstrando conhecerem os dados da literatura
vigente que recomendava avaliação da inconsciência, ausência de respiração e de
pulsos nas grandes artérias(13-14). Porém, observou-se que a ausência de
consciência foi a alternativa menos assinalada pelos sujeitos de ambos os
grupos. Apesar da inconsciência ser um dos sinais da PCR(14), ela pode ser
decorrente de outras alterações que não esta e, por este fato, dificultar a
confirmação do diagnóstico de PCR. De acordo com as Diretrizes-2005, a
inconsciência (não-responsividade) associada à ausência de movimentos e de
respiração ou "gasping" determinam o diagnóstico de PCR e estabelecem o início
das manobras de ressuscitação(15).
Considerando que a realização da RCP pelo enfermeiro é um fator determinante
nos índices de sobrevida da PCR, pois, normalmente, é o primeiro profissional
presente nesse evento(4), e, tendo o conhecimento e implementando as manobras
de SBV, favorecerá o sucesso do atendimento(16). Neste estudo, observou-se que
a partir da etapa II, mais de 50% dos participantes de ambos os grupos
apresentaram respostas corretas quanto às condutas. A provável explicação para
este resultado pode-se dever à busca espontânea pelo conhecimento nos sujeitos
do grupo A e à participação no programa de capacitação no B.
Reconhecer o ritmo cardíaco por meio da monitorização eletrocardiográfica ou
com o uso das pás do desfibrilador agiliza o atendimento para a desfibrilação
nos casos de PCR por FV/TVSP(17). Estudo que comparou os acertos dos ritmos da
PCR entre os enfermeiros de unidades com e sem equipamentos de monitorização
cardíaca demonstrou que este percentual foi maior no primeiro grupo(18). Nesta
pesquisa, os enfermeiros submetidos ao programa de capacitação apresentaram
mais respostas corretas sobre os ritmos encontrados na PCR.
Pode-se observar que nas questões das definições sobre SBV e SAV, o grupo B
apresentou destaque em relação às respostas corretas quando comparado ao A.
Este fato pode ser relacionado ao conteúdo abordado no programa, que seguiu as
padronizações do SBV/SAV, presentes nas Diretrizes-2000.
Quanto às possíveis formas de ventilação durante a RCP, o estudo mostrou baixo
índice de respostas corretas, o que denota desconhecimento ou resistência dos
participantes em assinalar as alternativas relacionadas à ventilação mecânica
ou à boca-a-boca como sendo outras possibilidades para ventilar o paciente.
Este achado pode ser explicado pela utilização frequente de ressuscitador
manual no ambiente hospitalar durante a RCP e pouca experiência na manipulação
de ventiladores mecânicos. Na prática clínica, a ventilação mecânica não é
muito utilizada na RCP. De acordo com a literatura(15), um estudo que avaliou a
forma de ventilação (manual vs automática) de pacientes em PCR extra-hospitalar
demonstrou que as concentrações dos gases sangüíneos destes não apresentaram
diferenças significativas.
Em relação à CTE, os sujeitos de ambos os grupos apresentaram respostas
semelhantes no item posicionamento das mãos, ou seja, a maioria mostrou
respostas PC. Já no subitem postura corporal, ambos mostraram percentuais
próximos de 50% ou mais de corretas em todas as etapas.
O preconizado para a realização da CTE nas Diretrizes-2000 era uma freqüência
de 100 compressões/min, na proporção de 15:2, sincronizadas ou não com as
ventilações, com um ou dois socorristas(13). Na Diretriz vigente (2005), o
recomendado é de 30:2, independente do número de socorristas. A ênfase é para a
qualidade (deprimir o tórax 4 a 5cm) e freqüência das compressões torácicas
(100/min), assim como minimizar as interrupções das CTE. Havendo dois
socorristas, recomenda-se o revezamento entre eles a cada dois minutos(15).
Nas questões 9, 10 e 11, relacionadas ao procedimento de desfibrilação, as
respostas corretas, em ambos os grupos, permaneceu superior a 50% nas três
etapas. Entretanto, houve diferenças significativas e distintas. Quanto à
posição utilizada para colocação das pás-eletrodos na desfibrilação (questão
9), houve diferença no desempenho dos sujeitos do B em relação ao A na etapa
III. Nas questões 10 e11, relacionadas às cargas inicial e máxima,
respectivamente, houve diferença significativa entre os grupos na etapa II.
A desfibrilação precoce é hoje, sabidamente, um procedimento que melhora
consideravelmente o índice de sobrevida de um paciente em FV/TVSP(19-20). Nos
Estados Unidos é facultado ao enfermeiro a realização deste procedimento,
porém, no Brasil, tal responsabilidade cabe ao médico. O enfermeiro pode e deve
saber reconhecer o ritmo, e isto agiliza o atendimento. Nas Diretrizes-2000,
era recomendada a aplicação de até três choques consecutivos com cargas
crescentes, sem interposição de CTE, no tratamento da FV/TVSP, enquanto que nas
Diretrizes-2005 a recomendação é de um único choque (360J monofásico ou 200J
bifásico), seguido imediatamente de retomada da RCP, iniciando com as CTE, até
completar cinco ciclos ou dois minutos, antes da verificação do pulso. Alguns
autores(21-22) sugerem e encorajam o uso de desfibriladores elétricos
automáticos (DEA) em locais de baixa ocorrência de PCR e para indivíduos com
dificuldade de reconhecer os ritmos. Identificando a PCR e dispondo de um DEA,
a desfibrilação deve ser efetuada o mais rápido possível(23).
A questão 12, relacionada às vias de administração dos fármacos, na etapa II,
apresentou diferença estatisticamente significativa das respostas, resultado
que reforça a necessidade de atualização dos profissionais após as mudanças que
ocorrem nas Diretrizes sobre RCP. Além disso, conhecer o efeito dos fármacos,
modos de administração e mecanismos de absorção podem contribuir efetivamente
para o sucesso da RCP. Em 2000, a via intra-óssea era pouco recomendada em
virtude de pequenas evidências da sua eficácia(24). A partir de 2005, as
Diretrizes recomendam o uso das vias intravenosa e intra-óssea. Embora muitos
medicamentos possam ser absorvidos pelo pulmão, a via endotraqueal não é
recomendada como preferencial, pois as doses da maioria dos medicamentos por
esta via são desconhecidas. Caso não haja disponibilidade de um acesso
intravenoso ou intra-ósseo, a dose recomendada pela via endotraqueal é de 2,5
vezes a dose intravenosa(23,25).
As medicações preconizadas nas Diretrizes-2000 eram: adrenalina, atropina,
vasopressina, bicarbonato de sódio, lidocaína e amiodarona. Em 2005, permanecem
as mesmas, exceto o bicarbonato de sódio, estando seu uso restrito à PCR por
acidose metabólica ou hiperpotassemia, já que alguns de seus efeitos adversos,
como a redução da resistência vascular sistêmica, alcalose e hipernatremia, são
freqüentes(25). Nesta pesquisa, obteve-se elevado número de repostas PC em
ambos os grupos, nas três etapas, mostrando o desconhecimento da finalidade
destes fármacos. Estes dados sugerem que o enfermeiro sente-se responsável
apenas pela administração dos medicamentos, e não pelo conhecimento de suas
ações farmacológicas.
Os benefícios dos registros do atendimento da PCR incluem: respaldo legal,
comunicação entre os membros da equipe e detalhamento do quadro do paciente.
Além disso, devem ser feitos de acordo com o estabelecido pelo COREN, ou seja,
de forma clara, concisa e objetiva, para que as informações possam ser
transmitidas e utilizadas por toda a equipe(26). Um estudo(27) verificou a
viabilidade de um impresso para registro do atendimento e comunicação entre as
equipes. Porém, na presente pesquisa evidenciou-se o desconhecimento de
impressos para o registro da RCP e dos itens que devem constar na descrição do
atendimento.
No hospital em questão, é responsabilidade do enfermeiro a checagem do carrinho
de parada. Apesar disso, houve percentuais elevados de respostas de que o
técnico também deve realizar, para conhecimento/familiarização do conteúdo.
Conhecer o conteúdo do carrinho de emergência e a disposição dos materiais pode
significar o sucesso do atendimento. Uma pesquisa(28) aponta a manutenção dos
recursos para o atendimento da PCR, tanto sob o aspecto da checagem dos
materiais e equipamentos como pelo seu suprimento, de grande responsabi-lidade.
Em relação à questão 18, no grupo A, etapa II, responderam afirmativamente pela
busca espontânea de informação sobre PCR apenas 3/21 e, na III, as respostas
sim e não obtiveram os mesmos números (10/21). No grupo B, 24/38 mencionaram
contato com a PCR após a capacitação, 21/38 consideraram seu atendimento
satisfatório, 3/38 pouco satisfatório e 14/38 não satisfatório. Diante destes
resultados, percebeu-se, nos indivíduos do grupo A, ao serem questionados, uma
preocupação na busca espontânea pelo conhecimento, e, nos do grupo B, o
favorecimento da auto-avaliação e da atualização.
CONCLUSÂO
Os conteúdos abordados e os instrumentos utilizados para a avaliação
subsidiaram de forma favorável a execução e avaliação do programa de
capacitação elaborado e implementado para o atendimento de PCR/RCP pelos
enfermeiros. Verificou-se que o desempenho dos sujeitos do grupo B após uma
semana (etapa II) foi superior em relação ao de três meses (etapa III).
O comportamento do desempenho dos enfermeiros do grupo A em relação aos do B
diferiu na forma de apresentação, ou seja, observou-se melhora progressiva nas
etapas do A, enquanto, no grupo B, foi de forma oscilante. Mas, a partir da
etapa II, os do B apresentaram conhecimentos superiores aos do grupo A sobre
PCR/RCP.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante destes resultados acredita-se que o programa de capacitação elaborado
poderá ser utilizado na instituição que foi objeto deste estudo, com a
possibilidade de ser adaptado para a utilização em outras instituições, e,
também, atualizado a cada publicação das novas diretrizes. Sugere-se que o
programa de capacitação deva ser aplicado regularmente, com uma periodicidade
trimestral ou semestral, pois, como pôde ser observado, há um nítido declínio
do conhecimento com o passar do tempo.