Reintegração da criança e do adolescente vítimizados na percepção dos pais
Reintegração da criança e do adolescente vítimizados na percepção dos pais
Reintegration of Victimized Children and Adolescents in their Parents´ View
Reintegración del nino y del adolescente victimas de su entorno
Camilla Soccio MartinsI; Maria das Graças Carvalho FerrianiII
IEnfermeira, Pós-Graduanda em Enfermagem pela Escola de Enfermagem de Ribeirão
Preto da Universidade de São Paulo - EERP/USP
IIProfessora Titular do Depto, de Enfermagem Materno-Infantil e Saúde Pública
da EERP/USP. E-mail do autor:camillamartins@hotmail.com
1 Introdução
A violência doméstica contra crianças e adolescentes tem sido um fenômeno
responsável por um grande contingente de vítimas. Esse tipo de violência está
democraticamente espalhada em várias classes sociais. A possibilidade de
identificação de casos de violência muitas vezes se dá por profissionais que
atuam diretamente junto à criança e ao adolescente, principalmente por aqueles
vinculados à Educação e à Saúde. As instituições vêm constantemente sendo
chamadas a um reordenamento para a sua adequação à nova proposta de atenção
integral à criança e ao adolescente, como sujeitos de direitos.
A compreensão do fenômeno da violência doméstica, coloca em pauta a necessidade
de construirmos um referencial analítico, capaz de permitir a compreensão desse
fenômeno na especificidade que ele tem hoje, levando em consideração sua
complexidade, suas diferentes formas de manifestação e finalmente o
reconhecimento da articulação existente entre violência e os aspectos sociais e
culturais de uma determinada sociedade.
Conceituar violência vai depender do pólo epistemológico ao qual estamos nos
fundamentando e também, quais são os sujeitos e o espaço social envolvidos na
questão. É muito difícil conceituar a violência, principalmente por ser ela,
uma forma própria de relação pessoal, política, social e cultural. Muitas
vezes, resultante das interações sociais, ou ainda, um componente cultural
naturalizado(1).
A violência doméstica contra crianças e adolescentes representa todo
ato ou omissão praticado por pais, parentes ou responsável da criança
ou adolescente que sendo capaz de causar dano físico, sexual e/ou
psicológico à vítima implica de um lado, numa transgreção do poder,
dever de proteção do adulto, e de outro, numa "coisificação" da
infância, isto é, numa negação do direito que os adolescentes e
crianças tem de serem tratados como sujeito e pessoas em condição
peculiar de desenvolvimento(2:32).
Consideramos que o fenômeno da violência doméstica possui várias modalidades:
violência física, violência sexual, violência psicológica e negligência.
A violência física contra a criança é qualquer ação, única ou repetida, não
acidental, cometida por um agente agressor adulto, que lhes provoque
conseqüências leves ou extremas como a morte(2). A literatura é muito
controvertida em termos de quais atos podem ser considerados violentos, mas há
recentes pesquisas ressaltando que é qualquer ato disciplinar que atinja o
corpo de uma criança ou adolescente. Prova disso é o surgimento de legislações
que proibiram o emprego da punição corporal, em todas as suas modalidades, na
relação pais-filhos. No Brasil, essa questão passou a ser contemplada mais
adequadamente na legislação brasileira a partir da Constituição Federal de 1988
e, em particular, do Estatuto da Criança e do Adolescente, lei 8069 de 13/07/
1990.
De acordo com a literatura, a violência sexual é todo ato ou jogo sexual,
heterossexual ou homossexual, cujo agressor esteja em estágio de
desenvolvimento psicosexual mais adiantado. Tem por finalidade estimulá-la
sexualmente ou utilizá-la para obter estimulaçãosexual.(2) Além das
conseqüências físicas, a violência sexual traz também conseqüências
psicológicas e sociais, podendo observar dificuldades de aprendizado, fugas de
casa, queixas psicossomáticas, mudanças súbitas no comportamento, aversão ou
desconfiança de adultos, entre outros.
Dentre as formas registradas de violência no âmbito familiar, constatamos na
literatura a ausência de estudos sobre a violência sexual contra crianças e
adolescentes. Portanto, num campo tão amplo de possibilidade de violência
sexual que envolve situações peculiares, os crimes sexuais que acometem
crianças e adolescentes dentro da família é de difícil detecção.
A violência doméstica psicológica é aquela que "se apresenta geralmente sob as
formas de rejeitar, aterrorizar, ignorar, corromper, criar expectativas irreais
ou extremadas"(3:168). Ameaças de abandono também podem tornar uma criança
medrosa e ansiosa, representando formas de sofrimento psicológico.
No que concerne à negligência por sua vez é caracterizada pela falha na
assistência ou provimento das necessidades básicas de uma criança. Configurada
quando os pais falham em termos de alimentar, de vestir adequadamente seus
filhos, de prover educação e supervisão adequadas, e quando tal falha não é o
resultado das condições de vida, além de seu controle. Entre os pais
negligentes há um consumo elevado de drogas, de álcool e uma presença
significativa de desordens severas de personalidade(2). Estudos indicam que
existe uma preponderância da população de baixa renda no conjunto de famílias
negligentes(4).
As conseqüências da violência incidem diretamente na criança e/ou adolescente,
sobre o agressor, e no final sobre a sociedade, uma vez que a violência é
reproduzida ideologicamente pelo núcleo familiar que através de gerações delega
aos seus descendentes o que aprendeu e vivenciou. Algumas dessas conseqüências
podem desencadear sérios riscos de drogadição, prostituição, problemas no
aprendizado, promiscuidade, depressão e dificuldades de relacionamento, entre
outras.
Constatamos, portanto, que a violência doméstica e suas conseqüências são
devastadoras para as crianças e adolescentes que se inserem em uma trama social
que fragiliza e quase sempre destrói seu processo de identificação com o mundo.
Considerando a importância da temática e do envolvimento da enfermagem, neste
cenário, realizamos este estudo sobre crianças e adolescentes vítimas de
violência doméstica, com vistas a conhecer melhor o fenômeno e promover o
planejamento na assistência de enfermagem.
2 Objetivo
Conhecer a percepção das famílias agressoras acerca da reintegração da criança
e do adolescente que foram abrigadas no Centro de Atendimento à Criança e ao
Adolescente Vitimizados (CACAV), no município de Ribeirão Preto-SP, em
decorrência da violência familiar.
3 Metodologia
O presente estudo é descritivo e exploratório e de cunho qualitativo. Essa
abordagem é definida como aquela capaz de aprofundar a complexidade de
fenômenos, fatos, processo, particulares e específicos de grupos mais ou menos
delimitados em extensão e capazes de serem abrangidos intensamente(5).
Os dados foram coletados através da entrevista semi-estruturada e da observação
participante. A entrevista é um dos principais meios que tem o investigador
para realizar a coleta de dados sendo aquela capaz de partir de certos
questionamentos básicos, apoiados em teoria e hipóteses que interessam a
pesquisa e que em seguida, oferecem amplo campo interrogativo, fruto de novas
hipóteses que vão emergindo a medida que recebem as respostas do informante(6).
A amostra constitui-se de nove famílias que tiveram pelo menos um de seus
membros (sendo criança e/ou adolescente) institucionalizado no CACAV por estar
envolvidos nos episódios de violência intrafamiliar. Os componentes do núcleo
familiar entrevistado foram os pais, enfocando-se sua vida atual,
relacionamento familiar e suas percepções sobre a reintegração de seus filhos
após terem voltado para casa. As entrevistas foram gravadas e transcritas pelas
pesquisadoras e identificadas com os números de 1 a 9 optando pela letra E de
entrevistado.
A investigação ocorreu no período de janeiro a fevereiro de 2002 no ambiente
familiar das vítimas que foram abrigadas no CACAV e posteriormente reintegrada
no seu lar de origem. A pesquisa segue as normas da resolução nº 196/96 - CNS e
aprovado pelo Comitê de Ética segundo protocolo nº 0120/200.
Analisamos esses dados de acordo com a técnica de análise de conteúdo. Essa
modalidade consiste em descobrir os temas que compõe uma comunicação cuja
presença signifique alguma coisa para o objeto analítico visado(7).
4 Análise dos resultados e discussão
4.1 Caracterização das famílias das vítimas de violência intrafamiliar
De acordo com os dados, dentre as nove famílias que foram estudadas, a
violência doméstica mais evidenciada foi a negligência, atingindo cinco
famílias. A violência física aparece em três famílias e a violência sexual
ocorreu em duas, sendo uma delas associada à negligência.
Constatamos, então, que a negligência apresentou maior incidência dos casos em
contraste com um estudo realizado na região de Ribeirão Preto no Fórum da
Comarca de Jardinópolis - S.P. em 2001, evidenciando a confirmação de uma maior
incidência dos casos de violência física num total de 69,4% seguido depois de
negligência com 20,8% e sexual com 9,7%(8).
De acordo com o nosso estudo, dezessete crianças e adolescentes, na faixa
etária de 2 a 16 anos, foram vitimizados, sendo nove do sexo feminino e oito do
sexo masculino. Quanto à escolaridade, oito crianças estão matriculadas na
escola, quatro não estudam, apesar de estarem em idade escolar, e cinco têm
entre 2 e 6 anos e não freqüentam creche e nem a pré-escola. Entre as crianças
que estudam a freqüência escolar é insatisfatória.
As vítimas mais freqüentes da violência doméstica encontram-se na faixa etária
entre 0 a 14 anos de idade. O fenômeno violência é parte da chamada questão
social, constituindo hoje no Brasil, na segunda causa de mortalidade no
obituário geral e a primeira causa nas faixas de 5 a 9 anos(1).
A faixa etária das mães dessas crianças e adolescentes está entre 23 e 41 anos
de idade e a dos pais e padrastos está entre 30 e 58 anos. A maioria dos pais
não completou sequer o ensino fundamental. Apenas uma mãe e dois pais o
concluíram. Tais resultados diferem dos encontrados em outros estudos, trazendo
que 88,0% dos agressores finalizaram pelo menos o ensino fundamental(8).
Quanto à ocupação dos pais, cinco estão atualmente desempregados, dois são
servente de pedreiro e dois são operários. Todas as mães são donas de casa,
exceto uma. Tais dados parecem significativos no que concerne à tipificação do
alto desemprego existente, e como tal fato acaba por afetar a realidade
familiar. Ainda podemos dizer que o desemprego é um dos fatores que cria
possibilidade de agressão na família, uma vez que, o fato de estar em casa sem
tarefas específicas, facilita, por motivos ligados á insatisfação, entre
outros, a violência.
Cabe ressaltar que o uso de álcool está relacionado à violência. Três pais e
quatro mães são usuários de álcool. O alcoolismo não causa a vitimização, mas
funciona como facilitador quando já existe a predisposição para a violência.
4.2 Núcleos Temáticos
De acordo com a técnica de análise de conteúdo, descobertos os eixos em torno
dos quais giram os conteúdos expressos pelos sujeitos entrevistados, foram
definidas as temáticas que servem para classificar e compreender os depoimentos
em geral. Essas temáticas estão abaixo definidas.
4.2.1 A volta da criança e adolescente
Identificamos que, para os pais, os valores relacionados ao bom comportamento
de uma criança estão atrelados a ficar em casa e não sair para a rua, o que de
fato ocorre após seus filhos serem desabrigados como podemos observar nas falas
a seguir: O comportamento deles tá melhor porque agora eles tão parando mais
dentro de casa, é que eles gostam muito de ficar na rua e agora tão ficando
aqui dentro (E-3). O comportamento deles tão ótimo, não sai mais pra rua e
agora a gente tá mais feliz. (E-6)
Por outro lado, percebemos que o mau comportamento da criança e do adolescente
é reconhecido, pelos atores sociais estudados, através da desobediência das
normas impostas, o que é agravado pela forma agressiva como as crianças e
adolescentes reagem.
Uma pessoa que cresce em um ambiente onde a violência é a moeda corrente, vê o
outro e o mundo de forma muito diferente de alguém que foi acolhido em um
ambiente onde há respeito pessoal. Medos, culpas e ressentimentos dirigem o
mundo dessas pessoas no modo de perceber a família(9). Evidenciamos através das
falas: O comportamento dela comigo ficou pior do que tava, porque agora ela
começou a responder pra mim(E-5). Quando ela voltou ela achou que é dona de si
e não me obedece, e por ela, ela quer mandar em mim (E-4).
O fato do comportamento das crianças e adolescentes constituir um dos núcleos
de referência, está diretamente relacionado à importância atribuída pela
família a este aspecto. A forma como a criança e o adolescente manifestam seu
comportamento, no entanto, está atrelada à forma como eles são educados.
De acordo com a nossa percepção sobre os dados desse estudo, a violência
intrafamiliar e o relacionamento dos pais com os filhos é um processo dinâmico
e complexo, que vai se moldando e se construindo a partir das interações
ocorridas entre eles. Baseando nos símbolos e significados que cada um dos pais
traz em sua bagagem cultural e que vão sendo modificados também a partir das
interações sociais dos filhos. Estudar o relacionamento pais-filhos implica
necessariamente conhecer as representações dos pais.
A partir de dados levantados, notamos que duas famílias chefiadas por mulheres
que não trabalhavam, possuíam características semelhantes, tais como:
negligência contra seus filhos, condições precárias de higiene da casa.
Quanto ao fato da mãe estar muito presente nos dados encontrados, podemos
pensar que esta presença seja porque hoje se encontra um crescente aumento de
famílias chefiadas por mulheres em diversos segmentos sociais. Em nossa
realidade brasileira, também vem se apresentando um enorme aumento nas uniões
informais, podendo assim serem justificados pelo número significativo da
presença de crianças e adolescentes residindo junto as suas mães e padrastos.
(8)
A maternidade para estas mulheres, que geralmente não têm outra função além de
cuidar da casa e dos filhos, é vista como uma questão motivadora. Por isso,
quando essa criança é retirada de casa, a mãe presencia um sentimento de perda.
Já com a volta dessa criança, tal sentimento deixa de existir e a mãe sente-se
mais segura e disposta a enfrentar as dificuldades existentes, como é
explicitado nas falas a seguir: Melhorou bastante, né. Eu me senti mais bem com
ela porque sem ela eu tava um pouquinho ruim, porque eu tava desanimada, sabe,
eu não tava com vontade de nada (E-5). Eles fizeram eu mudar em tudo, em lutar,
em viver (E-8).
A institucionalização é vista, no estudo, como amparadora de problemas
comportamentais, ajudando os pais ao invés de puni-los, e não fazendo-os
repensar a cerca da violência praticada, como podemos constatar nas falas
abaixo:
Várias vezes quando eles foram abrigados pra mim foi uma coisa bem melhor,
né.Porque eu ficava sabendo que eles tavam lá e não tavam na rua e aí eu ficava
mais tranqüila (E-6). Depois que eles voltaram eles não são mais de briga, deu
o horário para eles ditá , eles deitam, esse abrigo me ajudou muito, ante eles
terem ficado tudo lá do que aqui(E-7).
Para outras famílias a institucionalização serviu, mesmo que de maneira
indireta, para repensar o cuidado com os filhos, como é possível observar: O
que melhorou é que as pessoas achavam que eu não gostava dos meus filhos, só
que eu consegui provar pra todo mundo e fiz das tripa coração pra pega meus
filho de volta(E-2).
Citamos outro exemplo da percepção dos pais que foge ao objetivo da
institucionalização, vista aqui como benéfica ao crescimento e desenvolvimento
da criança: Depois do abrigo, ela desenvolveu bem, principalmente na fala, ela
tá falando muita coisa que antes ela tinha dificuldade(E-1).
As crianças e adolescentes privados dos cuidados em família tendem a ter seu
futuro comprometido, através do comprometimento de sua capacidade de ser, de
cuidar de si e do outro(10). O aprendizado infantil se constrói de relações
múltiplas nas quais as crianças não são apenas objeto passivo e obediente.
Assim, a construção de identidade ancora-se na participação e integração do
sujeito em múltiplos universos sociais e na instância cultural, vinculados às
representações e modelos que caracterizam os integrantes desse universo(11).
Isso é comprovado nas falas que seguem: Agora ela piorou, ela vê as pessoas
falarem as coisas pra mim e ela fala também porque ela acha que é normal me
xingar como todo mundo me xinga(E-5). Eu percebi que ela voltou com bobeirada
de muleque que ela pegou dos muleque de lá, tipo xingar e maus modos(E-9).
Muitas crianças e adolescentes deixam evidentes em suas falas, a sua condição
de vulnerabilidade em relação às pessoas ou mesmo em relação ao meio, a qual
emerge de suas experiências vividas que se mostram ameaçadoras.(10)
4.2.2 Estratégias Adotadas
Nos casos de crianças e adolescentes vitimizados, a Justiça da Infância e da
Juventude deve lhes oferecer uma medida de proteção. A primeira tentativa é a
de conscientizar os pais ou responsável pelos maus tratos. Vale lembrar que a
punição legal do agressor pelo crime cometido é importante, mas não se deve
deixar de lado que a violência leva e deixa conseqüências gravíssimas à vítima,
seus familiares e mesmo ao acusado(12).
Identificamos, como uma das estratégias da Justiça, a imposição da condição de
que as crianças e os adolescentes estejam estudando. Essa estratégia é efetiva,
na medida em que esse pais, de acordo com suas percepções, consideram
importante o estudo. Podemos constatar na fala: Agora, graças a Deus, eles tão
tudo ino pra escola (E-7).
As formas de ajuda adotadas pelo abrigo (CACAV) servem como amparador para
algumas famílias e para outras são vista como uma troca. Como exemplo podemos
citar a doação de cesta básica com a condição de que os filhos estejam
regularmente freqüentando a escola. Eu estava sem serviço, mas depois começou a
ajuda da prefeitura e aí minha vida mudou(E-5).
No que se refere aos aspectos psicológicos da família, o CACAV oferece uma
terapia familiar para os pais e os filhos, mas essa estratégia perdeu o seu
sentido devido ao não comparecimento das mães. Assim, acabam esquecendo que o
olhar dessas famílias sobre a violência está relacionada também ao seu estado
psicológico e à sua percepção social.
Essa discussão nos leva a pensar que todas as estratégias e até mesmo a
institucionalização da criança e do adolescente estão perdendo o seu objetivo
principal, que é o de estar conscientizando e educando as famílias a não
praticarem a violência intrafamiliar.
5 Considerações finais
Retomando o nosso objetivo que é conhecer a percepção das famílias agressoras
acerca da reintegração dessas crianças e adolescentes, e que foram abrigadas no
CACAV, no município de Ribeirão Preto-SP, constatamos que a violência doméstica
mais praticada é a negligência, sendo a maioria dos agressores desempregados e
usuários de álcool. Apreendemos dois grandes núcleos temáticos: a volta da
criança e do adolescente e estratégias adotadas.
Na primeira temática, observamos diferentes abordagens acerca do comportamento
das crianças e dos adolescentes quando voltam para casa. Algumas famílias
compreendem como bom comportamento o fato da criança não sair à rua. Quanto ao
relacionamento com os pais, este estudo mostrou que as mães percebem a
institucionalização do filho como perda da maternidade o que influencia em seu
estado emocional. Por fim, no que se diz respeito à visão da
institucionalização, a maioria dos pais acredita ser um castigo para os filhos
e rejeitam a idéia de aprendizado para a família.
Na segunda temática, a análise dos dados nos trouxe pontos relevantes da
violência intrafamiliar que chegaram à esfera do questionamento da atuação do
poder público. Apesar da atuação pública, neste cenário, através da
institucionalização da criança até a resolução dos casos de violência, ainda
faltam políticas públicas concretas que possam subsidiar a reversão da situação
da criança e do adolescente brasileiro.
Estes resultados nos levam a encarar a violência como processo social complexo
e que a existência de relações violentas está estreitamente relacionada a
múltiplos fatores e possui uma historicidade.
Não é possível admitir mais análises simplistas como que a criança é violenta
porque sua mãe é violenta. Os esforços dos profissionais e da sociedade para
combater o flagelo da violência doméstica têm se intensificado e o compromisso
têm despertado atenção para o problema gerando reações de todos os lados.
Entretanto, a questão continua sendo secundária, os recursos insuficientes e as
leis nem sempre são cumpridas.
Os profissionais de saúde são obrigados a notificar os maus-tratos cometidos
contra crianças e adolescentes(13). Para que este preceito legal seja cumprido
é preciso sensibilizar e conscientizar os profissionais da área para o
problema, fornecer mais conhecimentos sobre o tipo de atendimento a ser dado às
vítimas desses agravos, disponibilizar informações e capacitação para o
diagnóstico e intervenção.
Por tratar-se de um problema extremamente complexo e, ainda, com pouca
visibilidade, seria necessário um conjunto integrado e articulado de ações de
ordem econômica, política, cultural, legal, policial, terapêutica a curto,
médio e longos prazos, tanto no que se diz respeito à prevenção, como de
denúncia, defesa, atendimento às vítimas e responsabilização dos agressores
(14).