Hilda Anna Krisch: pioneira na enfermagem catarinense - formação e contribuição
HISTÓRIA DA ENFERMAGEM
1 Introdução
[...] desta imensidão a que chamamos passado, nós é que escolhemos
aquilo que será objeto de memória e conhecimento(1).
Um dos trabalhos mais conhecidos no Brasil sobre a história da enfermagem foi
escrito por Waleska Paixão(2) que, mediante pesquisa bibliográfica, faz uma
retrospectiva cronológica da enfermagem desde a idade antiga até o século XX,
dando ênfase à influência religiosa sobre a profissão. Citado na maioria dos
estudos sobre o assunto, vem servindo de livro texto nos cursos de graduação em
enfermagem de todo o país. Estudos mais críticos foram publicados a partir da
década de 80, com uma preocupação em compreender a enfermagem como parte de um
processo histórico, social, cultural, político e educativo, analisando e
denunciando de modo mais nítido a conduta humilde, conformista e dócil das
enfermeiras nas relações com quem representa o poder, contrário à sua conduta
autoritária, freqüentemente assumida nas relações com os demais membros da
equipe de enfermagem(3).
Conhecer a história da Enfermagem moderna em Santa Catarina, também não é uma
tarefa fácil. Isto porque durante muito tempo, não era uma prática das
enfermeiras escrever sobre sua profissão e sobre aqueles que fizeram parte de
sua história. Quando se tratava de escrever sobre a história da saúde, esta era
efetuada pelos homens, geralmente historiadores e/ou médicos, apresentando a
história da medicina, das práticas médicas e sobre os próprios médicos. Quando
estes escreviam sobre a enfermagem, faziam pequenas referências "às
enfermeiras", especialmente ressaltando as qualidades de docilidade e
submissão, desempenhando excelentes serviços, entretanto sempre sob seu
comando, ou acatando suas ordens(4,5).
Em face disso, o Grupo de Estudos de História do Conhecimento da Enfermagem
(GEHCE) vinculado ao Programa de Pós Graduação em Enfermagem da Universidade
Federal de Santa Catarina (PEN - UFSC) foi criado para resgatar a história da
enfermagem brasileira e atualmente, vem realizando ampla investigação sobre a
Enfermagem e sua atuação em diversas instituições de saúde da Grande
Florianópolis/Santa Catarina, no período compreendido entre 1940 e 2000. Uma
das finalidades do GEHCE é reconstruir a história de personagens que
contribuíram para a construção do conhecimento da enfermagem em Santa Catarina
a partir da inserção da enfermagem moderna brasileira.
Assim, este estudo tem como objetivo principal desvelar a historicidade da
primeira enfermeira catarinense formada por uma escola de enfermagem
brasileira, considerada padrão, analisando sua formação, trajetória e
contribuição profissional no cenário nacional, no século passado.
A importância deste estudo fundamenta-se no fato de que a enfermeira Hilda Anna
Krisch (HAK) pode ser considerada como uma figura representativa do seu grupo
social e de sua época, e se destacou dentro da profissão por sua formação. E
por ter assumido cargos que possibilitaram realizar importantes trabalhos,
contribuindo no desenvolvimento da profissão e fazendo com que esta se tornasse
mais visível e reconhecida no contexto social.
2 Metodologia
Trata-se um estudo qualitativo de natureza sócio-histórica. Na coleta de dados,
foram utilizadas fontes como: dados de entrevistas realizadas com HAK, em 1994,
na sua residência em Joinville/SC e com outras pessoas que atuaram na
Enfermagem (enfermeiras, práticas de enfermagem e atendentes) que mantiveram um
relacionamento mais estreito com ela. Estas entrevistadas foram orientadas
quanto ao estudo e quanto ao direito de participarem ou não da pesquisa,
conforme apregoado pela Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (CNS)
(6). Além destes dados, foram utilizadas outras fontes documentais escritas
pertencentes ao acervo do GEHCE, tais como: relatórios, cartas, histórico
escolar, artigos de revistas, de jornais, livros, capítulos de livros e
fotografias, além de outros documentos originais doados pelo Centro de
Documentação da Escola Anna Nery (EAN). Os dados foram organizados
inicialmente, traçando-se a biografia da enfermeira Hilda. Posteriormente,
estes foram analisados à luz do contexto da época vivenciada, distribuídos da
seguinte forma: a origem e formação; e o trabalho como enfermeira.
2.1 A origem e a formação
Descendente de família austríaca que chegou ao Brasil, em 1863, Hilda nasceu em
06 de março de 1900, em Joinville, Santa Catarina. Filha de João e Anna Krisch.
Seu pai era catarinense e sua mãe austríaca, que chegou ao país, aos dois anos
de idade(5,7). Realizou seus estudos básicos em Joinville, na Deutsch Schule
(Antiga Escola Alemã, atual Colégio Bom Jesus) e no Curso complementar na
Escola Conselheiro Mafra, num total de oito anos(8). A Escola Alemã, segundo
carta do diretor desta Instituição para a diretora da EAN, Sra. Bertha Lucile
Pullen, era considerada de "alto nível", dentro dos padrões germânicos
(Realschule), que dava direito ao aluno, o de ingressar em uma Universidade
alemã, após a conclusão do curso(9).
Após concluir seus estudos básicos, Hilda passou a trabalhar na Casa de Saúde
Dona Helena, em Joinville. Na época, era muito comum, que famílias alemãs,
enviassem suas filhas para conhecerem e trabalharem em instituições de saúde,
assim como nas de ensino. Desta forma, estas moças tinham a oportunidade de
aprender algum ofício profissionalizante, e também de adquirir conhecimentos
que pudessem futuramente, utilizar na sua vida familiar, quando viessem a
contrair matrimônio(10).
Se analisarmos o contexto da época, verificamos que nas famílias tradicionais
brasileiras, ainda subsistia a idéia de que a mulher deveria ser condicionada a
assumir os papéis de esposa e mãe, colocando-os à frente de seus interesses
pessoais. Sendo assim, deveria procurar uma carreira condizente com a sua
posição feminina como: ser professora primária, secretária, enfermeira, entre
outros. Profissões consideradas menos qualificadas e competitivas no mercado de
trabalho. Quanto ao homem, sua socialização era feita, visando dar-lhe uma
profissão, afinal era destinado a ele, a responsabilidade pelo sustento
familiar(11).
Concordamos com a idéia de que romper com a cadeia de condicionamentos, que é
transmitida de uma geração à outra, não é uma tarefa simples, mas existem
momentos históricos em que tais operações podem resultar mais fáceis que em
outros. Estes momentos surgem de grandes crises, como as que enfrentamos ainda
hoje, como o mito da natural superioridade masculina em contraposição à natural
inferioridade feminina(12). Embora com estes condicionamentos, muito fortes na
época, Hilda, no período em que atuou na Casa de Saúde Dona Helena, conheceu o
então diretor, Dr. Norberto Bachmann, que sugeriu, que fosse fazer um Curso de
Bacterioscopia em São Paulo. Ela concordou, teve apoio familiar e seguiu para a
capital paulista, em 1927, a fim de realizar o referido curso.
A partir da sua permanência no Hospital Samaritano para a realização do Curso
de Bacterioscopia, Hilda intensificou o seu interesse pela enfermagem e passou
a freqüentar um curso de curta duração, oferecido pelo próprio Hospital. Após a
conclusão do mesmo, permaneceu por mais seis anos, trabalhando na instituição.
Posteriormente, resolveu aprofundar seus estudos, fazendo o exame de admissão e
ingressando na EAN, em agosto de 1933. Ao ser questionada sobre o seu desejo de
ingressar nesta Escola, se expressou do seguinte modo:
Em 1926, devido a uma machucadura, tinha que ir no Hospital
Helenetiff Joinville,passei a conhecer e gostar das irmãs, assim que
logo mais pratiquei lá um pouco. Fiquei gostando tanto, que vim em
1927 para São Paulo para fazer um curso no Samaritano, e fiquei.
Achei paz e satisfação na arte de ser enfermeira(8).
A Escola no início de sua criação, "era procurada por jovens com hábitos e
comportamentos com algum condicionamento ou modelação, distintivos de boas
maneiras e de conseqüente respeitabilidade"(13:170). O processo de seleção
incluía o preenchimento de uma ficha de inscrição, onde eram avaliadas as
condições físicas e de saúde da aluna, o estado civil, a religião e o motivo de
interesse pela profissão. As alunas que não possuíam o curso normal ou
equivalente, submetiam-se a um exame, que constava de questões de biologia
elementar, português e aritmética. Estas informações estão registradas nos
documentos da Escola, e redigidos da seguinte forma:
[...] ser mulher; ser diplomada por uma Escola Normal ou ter estudos
equivalentes; apresentar um atestado firmado por médico de Saúde
Pública avalizando as condições de saúde física, mental e ausência de
defeitos físicos da candidata: ter entre 20 e 35 anos; apresentar
referências de boa conduta, sendo que seria levado em consideração a
experiência da candidata em direção de casa, no serviço educativo e
comercial(14:131).
Hilda foi aprovada e após três anos de curso, recebeu seu diploma em 01 de
outubro de 1936. Por ter se destacado como aluna e possuir um perfil que se
caracterizava por ser vivaz, alegre, interessada, pontual, organizada, precisa,
simpática, conscienciosa, ter iniciativa, ser culta, falar três idiomas e
possuir uma excelente saúde física e mental, recebeu uma Bolsa de Estudos da
Fundação Rockfeller, para estudar nos Estados Unidos(15).
Hilda durante dois anos, realizou vários cursos, dentre eles: Cirurgia; Saúde
Pública em East Harlen; Administração Hospitalar, Psicologia Educacional e
Legislação de Enfermagem na Universidade de Columbia, em Nova York. E
finalmente realizou o Curso de Psiquiatria no Butler Hospital, em Road Island
(15).
O perfil de Hilda vem ao encontro de algumas idéias largamente difundidas
quando se fala da profissão Enfermagem, ou seja, as enfermeiras nascem, não se
fazem, já que a enfermagem é uma vocação nata. Florence Nightingale refletindo
sobre o significado de sentir vocação para alguma coisa, diz que
[...] ser enfermeira é executar o trabalho conforme o seu próprio e
elevado conceito do que é certo e o melhor para o doente, não apenas
para cumprir ordens, mas para sua própria satisfação. Porque, se a
enfermeira não o fizer para sua satisfação pessoal, de nada adiantará
ensiná-la a dizer-lhe que o faça(16:163).
Florence Nightingale dizia que utilizou a palavra enfermagem por falta de outra
melhor, considerando-a como arte e devendo incluir condições tais que, por si
mesmas, tornassem possível assistir em enfermagem(16). Quanto ao trabalho da
enfermeira, incorporamos três elementos principais: Espírito de Serviço (ou
ideal), Habilidade (arte) e Ciência(1). Estes elementos já haviam sido
sustentados por Florence quando colocava a idéia da enfermagem como arte, com
motivação religiosa, exigindo estudos e aperfeiçoamentos constantes, exercendo
influência moral pelo que delas emana, quase sem perceberem(17).
Nas Notas sobre Enfermagem, há uma referência quanto aos aspectos que a
enfermagem "deve ser" e facilmente podemos correlacionar com o mesmo "espera-
se" da mulher. Então vejamos "toda enfermeira deve ser uma pessoa com quem se
pode contar, isto é, capaz de ser uma enfermeira 'de confiança'.(.....) deve
ser estritamente sóbria, honesta e, mais do que isso, ser uma mulher religiosa
e devotada. (....) deve ser uma observadora segura, direta e rápida, e ser uma
mulher de sentimentos delicados e modestos"(16:138). Para Nightingale, a
enfermagem era tanto uma vocação como uma profissão e os dois aspectos deviam
estar unidos, sendo que a seu ver qualquer mulher poderia vir a ser uma boa
enfermeira.
2.2 A Associação Brasileira de Enfermagem e o seu trabalho como Enfermeira
A criação de uma Associação Brasileira de Enfermagem, surgiu a partir das
idéias de ex-alunas da EAN. Pois era conveniente tanto à Escola, que manteria
um certo controle sobre o conjunto das enfermeiras por ela diplomadas, como às
próprias ex-alunas, que teriam agregado ao seu diploma, o capital cultural
referente às credenciais de membro de uma associação profissional ligada a uma
instituição de prestígio como a EAN(18).
A tradição reconhece como 12 de agosto de 1926, a data de fundação da
Associação, ainda que se tenha poucos registros do período inicial da
Associação. Em 1927, quando foi eleita a 1ª diretoria da Associação Nacional de
Enfermeiras Diplomadas (ANED), tendo como presidente Edith Magalhães Fraenckel
(EMF). No período compreendido entre 1927 e 1929, as condições de funcionamento
da ANED não estão muito claras nos documentos analisados, parece haver
entretanto, forte influência das enfermeiras norte americanas, integrantes da
Missão Parsons. Neste ano, EMF reorganizou a ANED, porque queria solicitar sua
filiação ao Conselho Internacional de Enfermeiras (CIE), tendo sido atendida no
8º Congresso Internacional do CIE, realizado em Montreal em 1929. Ainda nesse
mesmo ano, providenciou o registro da ANED em cartório e comprou um terreno na
Ilha do Governador, Rio de Janeiro destinado à construção da Casa da
Enfermeiraa(19).
Em Montreal, onde ocorreu o Congresso do CIE, Edith Magalhães Fraenckel
participou da reunião de editoras de revistas das organizações membros da
entidade. Neste momento surgiam as primeiras discussões para criar uma revista
de enfermagem brasileira. Nascia assim, no Canadá a idéia de publicar Annaes de
Enfermagemb, primeira revista da Enfermagem Brasileira. Isto acontece em 1929
e, no próprio hotel em que estavam hospedadas as Enfermeiras brasileiras. Estas
reúnem-se e delineiam como deveria ser o periódico, que teria seu primeiro
exemplar publicado em 1932. A Publicação se viabiliza com a doação do papel
para impressão feita por Rachel Haddock Lobo, primeira editora da revista(20).
No final de 1938, EMF sai da presidência da ABEn, depois de quase doze anos a
sua frente. Em seu lugar, deixa uma nova liderança, Hilda Anna Krisch.
Ao assumir a presidência da Associação em 03 de novembro de 1938, Hilda passa a
implementar algumas mudanças e inovações como: a transferência da sede da
Associação para o internato da Escola Anna Nery; a transferência da biblioteca
para o pavilhão de aulas; a criação de algumas comissões para integrar a
Associação como: Educação, Legislação, Social, História da Enfermagem,
Instalação da sede e de Estatuto; o levantamento de informações sobre a
situação da Enfermagem no país; a elaboração de um anteprojeto regulamentando a
profissão a fim de evitar que o Ministério do Trabalho nomeasse pessoas que não
tivessem qualificação para assumir chefias de serviço, cargos de direção, entre
outros, que por direito deveriam ser ocupados somente por enfermeiras. Estas
foram algumas das importantes obras, realizadas por Hilda Anna Krisch frente à
Associação. Esta permaneceu como presidente até 1941, quando Edith foi reeleita
para presidir a Associação Nacional de Enfermeiras Diplomadas (ABED) por mais
dois anos (1941-1943). A sede da entidade é levada então, para São Paulo(20).
Observa-se como um fato bastante comum à época, o de que as primeiras
enfermeiras brasileiras, passaram a assumir a liderança da profissão, atuando
em espaços diversos: associativos, hospitalares e até mesmos governamentais. Em
todos estes, tornavam-se responsáveis por construir um perfil profissional de
qualidade e reconhecimento.
É o caso das contemporâneas Edith Magalhães Fraenckel, Rachel Haddock Lobo,
Hilda Anna Krisch, dentre outras. Esta última, como professora da EAN, passou a
atuar em 1939, no Pavilhão Miguel Couto do Hospital São Sebastião, na cidade do
Rio de Janeiro. Nesse período, Hilda foi solicitada pela Escola, a fazer uma
análise do campo de estágio, onde as alunas realizavam estágio referente à
disciplina de Enfermagem nas Doenças Transmissíveis. Depois de um período de
três meses de análise, ela descreve as precárias condições que tanto os doentes
viviam (falta de roupas, de materiais de higiene e limpeza), como as condições
em que os médicos, as enfermeiras e as alunas vinham atuando(21).
Interessante observar-se nos seus escritos, o cuidado minucioso do relato,
demonstrando a preocupação de descrever detalhadamente as condições físicas,
estruturais da instituição, dos equipamentos, dos materiais de consumo, bem
como, o reduzido quadro de pessoal em todos os níveis. Posteriormente, Hilda
encaminha o relatório para a Direção da Escola, justificando inclusive a demora
na entrega do Relatório, por falta de uma secretária que datilografasse.
Percebe-se uma preocupação com a profissão e com a qualidade da assistência
prestada à população, pois fazia muitos questionamentos acerca da atuação das
enfermeiras e da enfermagem de um modo geral. Esta maneira de ser e se
comportar, estava diretamente relacionado aos moldes estabelecidos para a
enfermagem da época, ou seja, de que as enfermeiras assumissem o trabalho
administrativo nas instituições de saúde, enquanto que o cuidado ministrado aos
pacientes era basicamente realizado pelos práticos e outros exercentes da
enfermagem.
A Escola Anna Nery na época impunha sobre as alunas uma rígida disciplina, um
excesso de horas de estudo/ trabalho, plantões noturnos diários, sem dispensa
de freqüência às aulas, atividades extra-curriculares e penalidades quando
ocorriam falhas ou quando transgrediam normas. As alunas deveriam ter controle
sobre suas emoções e buscar a perfeição no que faziam(22).
Entendemos que no momento em que o saber técnico (procedimentos) e o saber
científico são departamentalizados, há uma tendência na prática em aplicar os
"rituais de Enfermagem" de forma técnica com procedimentos absolutamente
idênticos a sujeitos diferentes, fazendo com que na relação existencial com as
pessoas doentes sejam omitidos seus saberes individuais. Por outro lado, quando
há um predomínio do conhecimento científico de enfermagem, este também é
isolado, transformando alguns grupos sociais em objetos sociais (clientes,
usuários, alunas, etc) e outros grupos, em sujeitos sociais (professoras,
enfermeiros, supervisoras, etc)(23).
Em 1942, o Governo do estado de São Paulo solicita a Direção da EAN, algumas
professoras para atuarem na organização do Hospital de Clínicas que estava
sendo construído, Hilda como enfermeira classe F, funcionária pública do
Ministério da Educação e Saúde e outras colegas da EAN, são solicitadas para
servirem junto a Faculdade de Medicina daquele estado, no sentido de
organizarem o referido Hospital.
Hilda então, passa a atuar novamente com a Edith, com quem já tinha uma relação
anterior na Associação e na própria EAN. EMF já vinha atuando como organizadora
da Escola de Enfermagem de São Paulo junto com Odair Pedroso (Chefe da Comissão
organizadora do Hospital de Clínicas). O grupo passa a planejar, organizar e
equipar o primeiro Hospital de Clínicas do País. No período de agosto de 1942 a
outubro de 1944, Hilda assumiu o cargo de Assistente da Sub-Divisão de
Enfermagem e posteriormente através da determinação do Dr. Enéas Carvalho de
Aguiar, assumiu o cargo de Chefe da Sub-Divisão de Enfermagem.
No período em que atuou no Hospital, assumiu a organização do espaço físico,
das enfermarias, a compra de materiais e equipamentos, a contratação de pessoal
e o treinamento dos mesmos. Após dois anos de um trabalho intensivo e
exaustivo, conseguiu juntamente com a equipe, ampliar o número de leitos do
Hospital para quinhentos e contratar mais de trezentos funcionários na Sub-
Divisão de Enfermagem. Conseguiu, ainda, fazer com que o Hospital de Clínicas
fosse totalmente equipado, aparelhado e organizado para fazê-lo funcionar
futuramente com um total de 1.200 leitos. Praticamente todo o trabalho de
planejamento de pessoal, material e equipamentos fora feito(24).
Após o término desse trabalho, o Ministério da Educação e Saúde resolveu lotá-
la na Delegacia Federal da Saúde em Porto Alegre, para atuar nos três Estados
do Sul. Entretanto, podendo escolher, optou em fixar-se no seu Estado natal,
Santa Catarina, onde passou a realizar muitas atividades, desde o planejamento
de inúmeros hospitais que estavam sendo pensados, a organização destes, a
compra de material e equipamentos, até o treinamento de pessoal de enfermagem
que na época, era constituído basicamente por práticos de enfermagem. Segundo o
depoimento de uma das funcionárias da época:
O trabalho de Hilda consistia em:Ensinar até lavar o chão, dar banho
de leito. Com a Hilda Krisch aprendemos a economizar, mas não deixar
faltar nada para o paciente. Ela sabia tudo(25).
Além do trabalho realizado nos hospitais e serviços de saúde, Hilda tinha a
preocupação com a atualização do pessoal de enfermagem e com os aspectos
científicos e culturais da profissão, por esse motivo, promoveu juntamente com
outros membros da enfermagem e dirigentes de instituições de saúde do Estado,
em 1956, a Primeira Semana de Estudos de Enfermagem. Esta, foi considerada um
sucesso por todos os participantes, tendo inclusive, a presença do Secretário
da Saúde e Assistência Social do Estado da época, Senhor Paulo de Tarso da Luz
Fontes, e de inúmeras pessoas que atuavam na enfermagem na capital e no
interior do estado, num total aproximado de 150 participantes. Nesta ocasião,
foi sugerido pelo então Secretário, Senhor Paulo Fontes à Superiora da
Congregação da Divina Providência e a Hilda, a criação de uma escola de
enfermagem, uma vez que a capital carecia de escolas de formação do pessoal
(26).
A criação de uma escola num curto espaço de tempo, veio acontecer em 1959,
quando foi criada pela Congregação Divina Providência a Escola de Auxiliares de
Enfermagem Madre Benvenutta, que passou a funcionar, no centro da capital -
Florianópolis(26). Esta pode ser considerada o passo inicial para o
investimento na formação profissional da enfermagem.
Neste ínterim, mais uma vez, Hilda recebe uma Bolsa de Estudos, desta vez da
Organização Mundial de Saúde (OMS) e viaja aos EUA, onde permanece durante
cinco meses. No seu retorno, adoece gravemente, é operada e se aposenta aos 55
anos.
A partir de 1961, depois de aposentada, ingressou no Museu da Imigração e
Colonização em Joinville, onde trabalhou por aproximadamente trinta anos.
Embora estando aposentada, nunca se desligou da enfermagem, mantendo freqüentes
contatos com as enfermeiras que chegavam para trabalhar em Santa Catarina,
proveniente de outros estados. Foi também, uma das fundadoras da Associação
Brasileira de Enfermagem - Seção Santa Catarina, em 1962. Além disso, recebeu
inúmeras homenagens de colegas enfermeiras, alunas e autoridades políticas,
tendo recebido inclusive o título de Cidadã Benemérita de Joinville e tem seu
nome em diversas escolas e centros acadêmicos. Em 24 de junho de 1995, ocorre o
seu desaparecimento.
3 Considerações finais
Podemos concluir a partir da sua formação e trajetória profissional que a
enfermeira Hilda Anna Krisch caracterizou-se por ser um marco na história da
Enfermagem Brasileira, devido aos importantes trabalhos realizados na
enfermagem, tanto à nível de associação, como na sua atuação na escola e
formação de alunos, como na assessoria de hospitais de grande porte nacional,
assim também em nível estadual, onde imprimiu sua marca na formação de pessoal
e na organização e implementação de serviços hospitalares. Além disso, teve
importante participação fora da profissão, quando foi responsável durante longo
tempo pela organização e manutenção de museu alemão em Joinvile.