Século XXI: nova cultivar de goiabeira de dupla finalidade
GENÉTICA E MELHORAMENTO DE PLANTAS
Século XXI: nova cultivar de goiabeira de dupla finalidade1
XXI Century: new cultivar of guava tree to double purpose
Fernando Mendes PereiraI; Celso Albano CarvalhoII; Jair Costa NachtigalIII
IProf. Titular do Departamento de Produção Vegetal da Faculdade de Ciências
Agrárias e Veterinárias, Universidade Estadual Paulista (FCAV/UNESP), Câmpus de
Jaboticabal. Via de Acesso Prof. Paulo Donato Castelane, km5, CEP 14870-000,
Jaboticabal, São Paulo
IIAluno do Curso de Pós-graduação em Agronomia da Faculdade de Ciências
Agrárias e Veterinárias, Universidade Estadual Paulista, Câmpus de Jaboticabal-
SP
IIIPesquisador da EMBRAPA/CNPUV, Estação Experimental de Jales. Aluno do Curso
de Pós-Graduação em Agronomia da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias,
Universidade Estadual Paulista, Câmpus de Jaboticabal
INTRODUÇÃO
A goiabeira (Psidium guajava, L.) é originária da região tropical do continente
americano, com centro de origem, provável, na região compreendida entre o sul
do México e o norte da América do Sul. Hoje, esta espécie encontra-se
amplamente difundida por todas as regiões tropicais e subtropicais do mundo
(Medina, 1988).
A goiaba apresenta lugar de destaque entre as frutas tropicais, principalmente
devido ao seu valor nutritivo, com elevados teores de vitamina C, A e B, e ao
sabor e aroma característicos, que lhe conferem excelente qualidade
organoléptica (Pereira & Martinez Jr., 1986).
Em 1995, o Brasil apresentava uma área de 8.787ha, com uma produção de 255.984
toneladas. Atualmente, a região Sudeste é a maior produtora, com destaque para
o Estado de São Paulo, com 4.084ha e uma produção de 151.285 toneladas
(Agrianual, 1999).
No Estado de São Paulo, a produção de goiaba para processamento industrial
localiza-se, principalmente, nos municípios de Taquaritinga, Ibitinga e Monte
Alto. A goiaba para mesa é cultivada principalmente em municípios situados em
um raio de 100km da Capital, destacando-se Atibaia, Mogi das Cruzes, Itu e
Valinhos (Carvalho, 1996).
A valorização do produto como matéria-prima para a indústria e o aumento de
consumo na forma de fruta para mesa têm proporcionado mudanças no sistema de
produção e de comercialização. Com isso, torna-se necessário o uso de
variedades que atendam às exigências do mercado, tanto para mesa quanto para a
indústria (Tavares, 1993).
Um trabalho de melhoramento genético da goiabeira, por meio de seleção de
plantas originadas por sementes, pode possibilitar a obtenção de cultivares com
características adequadas para o consumo como fruta fresca e para a
industrialização (Pereira, 1984).
Com esta finalidade, são selecionadas plantas vigorosas e produtivas, com boa
adaptação, produtoras de frutos de boa aparência, com polpa vermelha, e que
apresentem grande valor nutritivo, especialmente ricos em açúcares, sais
minerais e vitaminas A e C (Pereira, 1995).
O presente trabalho teve por objetivo o desenvolvimento de novas cultivares de
goiabeira, com características tais que permitam sua utilização tanto para a
industrialização quanto para os mercados de frutas frescas.
MATERIAL E MÉTODOS
O trabalho foi desenvolvido no Pomar Experimental da Faculdade de Ciências
Agrárias e Veterinárias, da Universidade Estadual Paulista, Câmpus de
Jaboticabal, localizado a 21o15'de latitude Sul, 48o18' de longitude Oeste e
595m de altitude. O clima da região, segundo a classificação de Köeppen, é do
tipo CWa, ou seja, subtropical úmido com chuvas no verão e estiagem no inverno.
O solo da área experimental é um Latossolo Vermelho-Escuro de textura argilosa.
Foram estudadas 219 plantas obtidas de quatro cruzamentos realizados por meio
de polinização cruzada entre cinco variedades. Os cruzamentos foram os
seguintes: 8501 - cultivares Rica x EEF-3; 8502 - cultivares Supreme-2 x
Paluma; 8503 - cultivares Rica x Patillo 5, e 8504 - cultivares Paluma x Rica.
Com as sementes extraídas de frutos oriundos da polinização cruzada, produzidas
nas plantas receptoras do pólen, procedeu-se a formação das mudas. O plantio
para o local definitivo foi realizado em 1987, utilizando-se de 25 plantas do
cruzamento 8501, 50 plantas do cruzamento 8502, 91 plantas do cruzamento 8503 e
53 plantas do cruzamento 8504.
Durante as fases de implantação e condução do pomar, foram realizados
adubações, controle de pragas e doenças, controle das plantas invasoras e
podas. Não foram utilizados irrigação e desbaste de frutos em nenhum dos anos
de avaliação.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
As avaliações foram iniciadas no ano de 1990, levando-se em consideração
características da planta e dos frutos, individualmente em cada cruzamento
(Tabelas_1, 2 e 3), conforme metodologia apresentada por Carvalho (1996). Nas
safras 1996/97 e 1997/98, foi feita a caracterização tecnológica dos frutos dos
melhores genótipos desenvolvidos, conforme metodologia apresentada por Lima
(1999) (Tabela_4).
Após dez anos de sucessivas avaliações, chegou-se à seleção da planta 8502-01,
que recebeu a denominação de Século XXI, e que apresenta as características de
planta e de frutos mais adequadas à utilização como fruta fresca, podendo ser
amplamente aproveitada para a industrialização.
As plantas da cultivar Século XXI são tão ou mais produtivas que a cultivar
Paluma (acima de 30 ton.ha-1), com ramificações de crescimento
predominantemente horizontal e de médio vigor, o que pode permitir a
implantação dos pomares utilizando-se de espaçamento menor do que o comumente
recomendado para a cultivar Paluma, que é de 7 x 6m.
A cultivar Século XXI apresenta maturação precoce (Tabela_1), com ciclo de
cerca de 130 dias desde a floração até a maturação dos frutos, comparado com a
cultivar Paluma, cujo ciclo é de cerca de 158 dias (Pereira, 1995).
Uma das principais características desta cultivar é o grande tamanho de seus
frutos (Tabelas_2 e 4), principalmente se considerarmos que, na planta em
estudo, não são realizados tratos culturais, como o desbaste de frutos e
irrigações, normalmente utilizados em pomares comerciais de goiabas para mesa.
O tamanho dos frutos, o ótimo sabor e o bom aspecto são algumas características
mais importantes para o mercado de fruta fresca, pois goiabas maiores e
saborosas são preferidas pelo consumidor e, por isso, alcançam melhores preços
no mercado (Kavati, 1997).
Os frutos apresentam rendimento de polpa firme de 76% (Tabela_3), o que está
acima de 70%, mínimo considerado para a seleção de frutos de goiabeira (Lima,
1999), e espessura do pericarpo acima de 160 mm, que confere não apenas boa
resistência ao fruto, mas principalmente ótima aparência.
O formato do fruto é ovóide e com pescoço de tamanho reduzido (Tabela_2). Estas
características foram alcançadas durante o processo de seleção, a fim de obter
um fruto mais resistente aos danos mecânicos, principalmente durante as fases
de colheita, classificação, embalagem e comercialização. Segundo Kavati (1997),
o formato da fruta pode determinar melhor aspecto visual ao conjunto embalagem/
fruta.
A cultivar Século XXI apresenta poucas sementes e com tamanho reduzido (Tabelas
2 e 4). Esta característica aumenta seu valor na indústria, pois possibilita um
maior rendimento industrial, bem como qualifica sua apreciação para consumo na
forma de fruta fresca, porque as sementes tornam-se menos perceptíveis durante
a mastigação.
Durante os anos de avaliação, esta cultivar apresentou mais de 80% dos frutos
com ausência de manchas no pericarpo e sem células pétreas, responsáveis por
prejuízos na aparência interna dos mesmos. Tais características são de ordem
fisiológica e estão associadas ao desenvolvimento do fruto, portanto sua
eliminação é bastante difícil de ser realizada.
Com relação à coloração externa (cor da epiderme), os frutos apresentam-se
verde-amarelados, com intenso brilho, contrastando com a coloração rosa,
intensa e brilhante, da parte interna, o que lhes confere ótima aparência.
Com relação à composição química (Tabelas_3 e 4), os frutos apresentam teores
de sólidos solúveis totais próximos a 10oBrix, considerados como padrão, e
acidez titulável de 0,474g de ácido cítrico.100g de polpa-1, o que resulta numa
relação SST/AT próximo a 20,0 (18,6), que confere aos frutos sabor bastante
adocicado. Segundo Pereira (1995), teores de sólidos solúveis entre 8 e 12oBrix
e acidez titulável em torno de 0,8g de ácido cítrico.100g de polpa-1 são
considerados satisfatórios para as diferentes cultivares de goiabeira.
Nos quatro anos de avaliação, o teor de vitamina C encontrado ficou próximo a
100mg de ácido ascórbico.100g de polpa-1, índice superior ao encontrado na
cultivar Paluma, utilizada como padrão de seleção para esta característica.
Convém salientar que os teores de SST, AT e vitamina C podem variar de acordo
com diversos fatores, principalmente com o grau de maturação utilizado durante
as análises. Para fazer a caracterização físico-química da cultivar Século XXI,
foram utilizados frutos no ponto de colheita comercial, que é caracterizado
pela mudança de coloração da epiderme (casca).
CONCLUSÃO
A cultivar Século XXI, graças às boas características de sua planta e de seus
frutos, apresenta amplas possibilidades de cultivo comercial como goiabeira de
dupla finalidade.