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BrBRCVHe0034-71672004000600024

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variedadeBr
ano2004
fonteScielo

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Violência no trabalho em enfermagem: um novo risco ocupacional REVISÃO/REVIEW/REVISIÓN

Violência no trabalho em enfermagem: um novo risco ocupacional

Violence in the nursing workplace: a new occupational risk

Violencia en el trabajo de enfermería: un nuevo riesgo ocupacional

Luciana Contrera-MorenoI; Maria Inês Contrera-MorenoII IEnfermeira. Mestre em enfermagem pelo Departamento de Enfermagem - FCM - UNICAMP IIEnfermeira. Professora Associada do Departamento de Enfermagem da FCM - Unicamp. Docente do Programa de Pós-graduação em Enfermagem. Coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisa em Trabalho e Saúde - Departamento de Enfermagem da FCM - Unicamp E-mail do autor: inesmon@fcm.unicamp.br

1 Introdução A violência no local de trabalho vem sendo definida como "incidentes no qual os trabalhadores são insultados, ameaçados, agredidos ou sujeitos a outros comportamentos ofensivos nas circunstâncias relativas ao seu trabalho"(1:1).

De acordo com a CAL/OSHA(2) a violência no ambiente de trabalho se caracteriza de três formas: - A violência externa que é provocada por alguém que não pertence a organização, ou seja, este tipo de violência é reflexo da violência que se tem nas ruas e é provocado por alguém desconhecido. Neste caso, os trabalhadores de saúde têm um risco maior de serem afetados, dependendo da localização geográfica da instituição de trabalho, como periferias e locais com elevado consumo de drogas; - A violência provocada pelo cliente, no qual os trabalhadores de saúde são uns dos mais afetados por lidar com uma clientela muito diversificada composta muitas vezes por pacientes psiquiátricos, dementes, delinqüentes, drogados, embriagados e até mesmo de ter que lidar com os familiares destes pacientes que se tornam agressivos com estes trabalhadores, principalmente em caso de morte; - A violência interna que é aquela que ocorre entre trabalhadores de uma mesma instituição, podendo vir tanto da hierarquia como de outros colegas de trabalho, sendo um exemplo deste tipo de violência o assédio moral(3).

Estudo de base populacional realizado na Finlândia(4) revelou que os enfermeiros de saúde mental e os médicos são umas das profissões mais violentadas no trabalho, perdendo apenas para guarda de prisão e policial. Para o autor isto é causa de preocupação, uma vez que os trabalhadores de saúde não estão preparados para lidar com a violência, que muitas vezes, vêm dos pacientes.

Em pesquisa realizada em um hospital regional, na Suécia, os autores referem que os trabalhadores de hospitais têm um grande risco de sofrer violência no ambiente de trabalho, no curso de suas carreiras, sendo que o risco é maior para os trabalhadores de enfermagem que trabalham na assistência(5).

Considerando a gravidade e o risco de sofrer violência no trabalho, justifica- se a necessidade de se investigar o tema, tendo este trabalho como objetivo apresentar uma revisão da literatura sobre o tema violência no trabalho em enfermagem.

2 Metodologia A informação bibliográfica foi encontrada consultando-se as bases de dados Medline, Lilacs, Dedalus, ProBe (Scielo e Elsevier Science) e Periódicos Capes, no período de 1990 a 2002.

Com base na leitura e análise dos artigos encontrados, este trabalho foi estruturado abordando os seguintes tópicos: tipos de violência mais comuns no trabalho em enfermagem, prevalência da violência no ambiente de trabalho, fatores associados ao risco de sofrer violência no ambiente de trabalho, conseqüências da mesma para a saúde do trabalhador e prevenção destes eventos.

3 Principais tipos de violência contra trabalhadores de enfermagem De acordo com o National Institute for Occupational Safety and Health- NIOSH(6) os trabalhadores de serviços de saúde têm um risco muito baixo de sofrer homicídio no trabalho, entretanto possuem um risco consideravelmente alto de sofrer agressões não fatais.

Estas agressões não fatais são as agressões verbais, as ameaças, as agressões físicas, o assédio moral e o sexual.

As agressões físicas mais relatadas na literatura contra trabalhadores de enfermagem são: arranhar, beliscar, dar pontapés, esmurrar, dar tapas, empurrar, apertar contra a parede, morder, agredir com o uso de objetos ou arma (7).

As agressões verbais são aquela que resultam muitas vezes em humilhação e indicam falta de respeito com a dignidade do indivíduo. Geralmente ocorre em forma de insultos, ofensas, usar um tom de voz alto e agressivo.

Ameaça é definida como promoção do uso da força física ou de poder resultando em medo de violência física, sexual, psicológica ou outras conseqüências negativas(8). Podem ser tanto verbais como com uso de objetos ou armas.

Geralmente ameaças são de agredir fisicamente, ameaças de prejudicar o emprego e ameaças de morte.

o assédio moral ou violência psicológica é definido de várias maneiras por diferentes autores, sendo chamado também de mobbingebullying.

[...] qualquer conduta abusiva (gesto, palavra, comportamento, atitude...) que atende por sua repetição ou sistematização contra a dignidade ou integridade psíquica ou física de uma pessoa, ameaçando seu emprego ou degradando o clima de trabalho(9:17).

Dentre as ações que caracterizam o assédio moral tem-se: isolar o trabalhador, desqualificar, desacreditar, induzir ao erro, dar tarefas vexatórias, recusar a comunicação direta, o abuso de poder por parte dos superiores hierárquicos e as manobras perversas conduzidas por uma ou mais pessoas do grupo de trabalho.

Alguns estudos não consideram o assédio sexual como um tipo de violência ocupacional, porém, neste trabalho o tema será abordado, uma vez que o assédio sexual está diretamente ligado ao assédio moral.

De acordo com o Projeto de Lei no 61 de 1999, artigo 216-A é considerado crime de assédio sexual: Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes a exercício de emprego, cargo ou função [...] incorre na mesma pena quem cometer o crime: I - Prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação e hospitalidade; II - Com o abuso ou violação de dever inerentes à ofício ou ministério(10).

Alguns autores apontam que os trabalhadores de enfermagem vêm sendo alvo deste tipo de assédio, o que afeta seriamente o trabalho em enfermagem(11).

4 Prevalência da violência no ambiente de trabalho Mensurar a extensão da violência no ambiente de trabalho é algo muito complexo, uma vez que uma série de impedimentos. A falta de uma definição consistente de violência seria um destes impedimentos, que a literatura traz inúmeros conceitos de violência, abrangendo desde agressão física até agressão verbal.

Além disso, a definição de violência por parte das vítimas também varia, o que dificulta ainda mais um diagnóstico da realidade. Outros impedimentos, citados pelo autor, são os métodos empregados para mensurar a prevalência da violência no ambiente de trabalho, uma vez que estes não abrangem a totalidade dos casos de violência(7).

Estudos de diversos países desenvolvidos como os Estados Unidos, Canadá, Finlândia, Suécia, Inglaterra têm sendo publicados em relação à violência no trabalho em saúde e especificamente em enfermagem. Não foram encontrados, nas bases de dados pesquisadas, no período de 1990 a 2002, estudos sobre a prevalência da violência no trabalho em enfermagem, no Brasil.

Através da análise da Comunicação de Acidente de Trabalho - CAT é possível avaliar se os trabalhadores de enfermagem brasileiros também são vítimas de agressões.

Em um estudo realizado em São Carlos - SP, através da análise das CATs dos serviços que desenvolvem ações de saúde no município, no ano de 2000, registrados junto a previdência social, foi encontrado que 3,9% dos acidentes de trabalho ocorridos nestes serviços eram agressões físicas provocadas por pacientes(12). Outro estudo com análise similar, realizado em Marília - SP, também encontrou registros de acidentes de trabalho de agressões físicas provocadas por pacientes e desconhecidos(13).

A violência no trabalho em um hospital de ensino no Canadá foi pesquisada utilizando registros do departamento de medicina ocupacional do hospital, durante o período de dois anos. Foram encontrados 242 registros de agressões físicas e 646 registros de agressões verbais. Os trabalhadores de enfermagem foram os que mais registraram agressões (80,2%), seguidos do pessoal de segurança, com 12,8% e apenas 1,0%, por médicos. Com relação ao tipo de agressão física notificada, 126 foram machucados e hematomas; 47, cortes e lacerações e 23, mordidas humanas e exposição a fluidos do corpo. Estas agressões evidenciam ainda um outro risco: o risco de contaminação por doenças infecto-contagiosas como a Aids, a Hepatite B e C(14).

Em um estudo realizado na Suécia com 2690 trabalhadores de enfermagem de diversas instituições de saúde foi encontrado que 29,0% dos entrevistados sofreram violência no ambiente de trabalho; 35,0% foram ameaçados; 30,0% foram testemunhas de violência contra colegas de trabalho e 27,0% consideravam a violência um risco ocupacional(15).

Na Suécia e Inglaterra, em pesquisa que comparou as experiências de violências dos trabalhadores de enfermagem de saúde mental, foi encontrado que 71,0% dos profissionais ingleses e 59,0% dos suecos sofreram violência no ambiente de trabalho, sendo o tipo de agressão mais freqüente a verbal e ameaças(16). Em algumas unidades psiquiátricas, o índice de violência contra trabalhadores é mais de 100 casos por 100 trabalhadores por ano(17).

Em estudo realizado com 5876 enfermeiros no Kuwait foi pesquisada a extensão da violência contra estes trabalhadores, sendo que 48,0% referiram ter sofrido agressões verbais; 7,0% agressões físicas e 36,0% testemunharam as agressões contra colegas de trabalho nos últimos seis meses. De acordo com os autores 51,0% das agressões físicas foram provocadas por pacientes; 44,0% das agressões verbais por familiares e amigos de pacientes e de 4,0 a 7,0 % das agressões físicas e verbais foram provocadas por colegas de trabalho e supervisores(18).

Com relação ao assédio moral, em pesquisa realizada na França com 163 pessoas que relataram ser vítimas do assédio, foi encontrado que o assédio moral predominou no setor terciário, como, na área de saúde e de ensino com 9,0% cada; a idade média das pessoas assediadas era de 48 anos, indicando uma prevalência nas pessoas com mais idade e que em 58,0% dos casos o assédio foi praticado pela hierarquia, 29% de diversas pessoas (chefia e colegas), 12,0% de colegas e somente em 1% dos casos de um subordinado(9).

O assédio sexual também tem sido alvo de estudo. Em pesquisa realizada nos Estados Unidos exclusivamente com enfermeiras foi encontrado que 71,8% das entrevistadas sofreram assédio sexual no trabalho. Os pacientes foram responsáveis por 53,4% das agressões e os médicos por 25,0%. Os comportamentos mais comuns de assédio foram propostas e intimidações, insinuações e toques, como, por exemplo, segurar com força, agredir com tapas, entre outros(11).

5 Fatores associados ao risco A literatura tem demonstrado que vários são os fatores associados ao risco de sofrer violência no trabalho em enfermagem.

O contato face a face entre profissional de saúde e cliente é um fator de risco para o trabalhador sofrer violência(6).

Fatores pessoais como, por exemplo, a atitude do profissional de saúde, que nem sempre é adequada, podem favorecer a ocorrência de atos de violência contra estes. A localização geográfica dos serviços de saúde, em regiões com elevados índices de violência externa, como periferias e locais em que tráfico de drogas, propicia também para que haja a violência no ambiente de trabalho(19).

Um outro fator é o tipo de cliente atendido, como pacientes psiquiátricos, com demência, drogados e pessoas envolvidas em gangues, pois geralmente possuem armas(19). Pacientes idosos também são fontes de violência e muitas vezes estes clientes atacam tanto verbal como fisicamente, sem que o trabalhador tenha provocado a agressão(20).

Em estudo realizado em unidade de atendimento primário a saúde verificou-se que os maiores índices de violência vinham de clientes que faziam uso de álcool e drogas. Outros fatores mencionados como geradores de violência foram a frustração com o serviçodevido a espera pelo atendimento médico e o estresse dos pacientes que estão com muita dor ou com distúrbios psiquiátricos ou emocionais(21).

As situações mais comuns em que ocorre violência contra o profissional de saúde são, em geral, quando o paciente está agitado ou é reprimido, quando recebe más noticias, ou ainda, quando lhe é solicitado fazer algo que não deseja.

Familiares e amigos ansiosos e angustiados também são fonte de violência contra trabalhadores de saúde principalmente em unidades de emergência aglomeradas (22).

O número reduzido de trabalhadores em hospitais também contribui para a violência no local de trabalho, pois dificulta o atendimento individualizado a cada paciente(23).

Com relação ao assédio moral vários fatores que podem levar uma pessoa a sofrer ou ser o precursor desta forma de violência, em parte, relacionado à globalização, sendo que muitos contextos ligados à ela favorecem a ocorrência de atos de violência no trabalho. O medo do desemprego e o aumento das pressões psicológicas relacionadas aos novos modelos de gestão podem ser fatores desencadeantes de assédio moral no local de trabalho(9).

6 Conseqüências da violência Tanto as agressões físicas como as verbais trazem efeitos negativos a saúde dos trabalhadores como tristeza, raiva, desapontamento, medo e perda da satisfação com o trabalho(24).

Em geral os trabalhadores que sofreram violência relatam conseqüências físicas, emocionais, pessoais e profissionais, podendo variar desde fraturas e tensão muscular(19), à sentimento de baixa auto-estima(16), depressão, ansiedade, falta de motivação, fadiga, irritabilidade, distúrbios de sono e alimentação (25).

Em se tratando do assédio moral as conseqüências específicas para a saúde do trabalhador também são gravíssimas, sendo freqüentes os seguintes sintomas: estresse, ansiedade, depressão (que, na maioria dos casos é severa e pode levar a suicídio ou tentativa de suicídio), distúrbios psicossomáticos (aumento de peso, emagrecimento intenso, distúrbios endocrinógicos, distúrbios digestivos, crises de hipertensão entre outros)(9).

Em um estudo de coorte, realizado com trabalhadores de hospitais finlandeses, foi encontrado que sofrer assédio moral no trabalho aumenta o risco de ter depressão e doença cardiovascular, sendo esta última, em parte, atribuída também à obesidade(26).

O assédio moral por ser intenso e de forma repetitiva pode levar ao estresse pós-traumático, no qual a pessoa assediada vive relembrando as cenas de humilhação e violência tanto em formas de flashbacksdolorosos como em forma de pesadelos(9). os sintomas do estresse pós-traumático podem se desenvolver não somente de atos diretos de violência, mas também indiretamente como o simples fato de testemunhar algum ato violento(27).

Outros estudos relatam como conseqüência do assédio sexual a raiva, desgosto, constrangimento, nervosismo, humilhação, vergonha, demonstrando que o assédio sexual pode ser prejudicial para estas trabalhadoras(11).

A violência também causa prejuízo para a instituição empregadora, pois sofrer violência aumenta a indisposição e o absenteísmo no trabalho(25); os trabalhadores que sofreram agressão evitam o contato com o paciente, o que prejudica a qualidade da assistência; alguns mudam de emprego (rotatividade), além da perda de produtividade dos trabalhadores que gera custos financeiros para a instituição(20).

7 Prevenção da violência nos serviços de saúde Considerando a gravidade destes episódios de violência que estão atingindo uma grande parcela de trabalhadores, resta-nos pensar em um meio de se aliviar estas conseqüências, no sentido de promover a saúde no trabalho destas pessoas e em uma forma de prevenção destes episódios. Poucos são os artigos que abordam estratégias de prevenção destes eventos, talvez por ser a violência um fenômeno muito complexo.

"Não existem estratégias universais para a prevenção da violência. Os fatores de risco variam de hospital para hospital e de unidade para unidade"(28:9).

Então, para que o plano de prevenção seja realmente eficaz, deve-se em primeiro lugar, levantar os fatores de risco de cada local de trabalho.

As estratégias de prevenção devem abranger os seguintes planos: controle ambiental (uso de dispositivos de segurança, como: detectores de metais, alarmes, monitoramento com câmeras, boa iluminação nos corredores); controle administrativo (organização do serviço para prevenir que o pessoal trabalhe sozinho e minimizar o tempo de espera do paciente, restringir o movimento do público nos hospitais) e modificação comportamental (treinamento aos trabalhadores para reconhecer e para administrar as agressões, resolver conflitos e manter a consciência que o risco de violência existe)(28).

Tendo como referência os riscos identificados pelo serviço de segurança, em 1999, em Washington foi criada uma legislação para proteger os trabalhadores de saúde contra a violência no local de trabalho, que abrange os registros de atos de violência no trabalho de qualquer natureza, visando a identificação dos fatores de risco; educação e treinamento para os trabalhadores para lidar com as situações de violência; pessoal de segurança nos serviços de saúde; atendimento as vítimas de violência, proporcionando apoio psicológico e condições físicas adequadas no local de trabalho para proteger os trabalhadores (29).

Com relação ao assédio moral, no Brasil, existem projetos de leis e leis aprovadas no âmbito federal, estadual e municipal(10), contudo é necessário que todos os trabalhadores tenham consciência das formas de violência e abusos que estão sendo expostos, para assim reivindicarem melhores condições de trabalho.

8 Conclusão O objetivo deste trabalho foi de fazer uma revisão bibliográfica sobre o tema violência no trabalho em enfermagem, apresentando os tipos de violência, a prevalência, fatores associados ao risco, conseqüências e medidas de prevenção destes eventos. Os estudos em geral, demonstram que a violência no trabalho em saúde e, especificamente em enfermagem, vem se tornando um problema de saúde pública, sendo que a violência ocupacional pode ser prejudicial à saúde e a carreira dos trabalhadores de enfermagem.

Com o aumento da violência estrutural, todas as outras formas de violência vem aumentando consideravelmente, necessitando de intervenções. Desta forma, recomenda-se que outros estudos relativos ao tema sejam desenvolvidos, principalmente no Brasil, uma vez que os mesmos ainda são escassos em nosso país.


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